Servidores públicos federais receberam, na noite de sexta-feira (27), um comunicado virtual a respeito de mudanças no código de ética do setor. Sem maiores explicações sobre o que será alterado, o e-mail antecipa que haverá uma “consolidação das regras materiais (princípios e valores morais e éticos, deveres e vedações do agente público) e processuais (rito do procedimento de apuração ética) em um único normativo”.
A proposta foi elaborada pelo intitulado Grupo de Trabalho Interministerial GT-Ética, formado por integrantes da Secretaria-Executiva da Comissão de Ética Pública da Presidência da República, da Controladoria Geral da União, da Advocacia Geral da União e do Ministério da Economia. Instituído pela Portaria Interministerial SGPR/ME/AGU/CGU nº 103, de 17 de dezembro de 2020, o coletivo tem a finalidade de elaborar proposta de revisão do Código de Ética Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal, de junho de 1994, e do Código de Conduta da Alta Administração Federal, de agosto de 2000. “O conteúdo do documento final ainda é de desconhecimento público. Sobre ele sabemos apenas o que tem sido divulgado pela Secretaria Especial de Comunicação (SECOM), bem como pelo e-mail enviado a todos os servidores públicos”, comenta o professor Ariston Azevêdo, da Escola de Administração da UFRGS.
Conforme o e-mail recebido pelo funcionalismo, a Comissão de Ética Pública “deverá deliberar sobre a proposta e, após aprovação do texto final, enviará ao Senhor Presidente da República para avaliação do Decreto”.
“Em um contexto de ataques aos serviços e servidores públicos e com a iminência da PEC da Reforma Administrativa, soa no mínimo preocupante que a atualização do chamado ‘código de ética’ dos servidores tenha sido feita sem um diálogo maior amplo com os trabalhadores, como as boas práticas de formulação de códigos de conduta apontam. As e os servidores públicos precisamos estar atentos para que o documento não se torne um instrumento de ameaças”, alerta Guilherme Dornelas, diretor do ANDES/UFRGS e professor da Escola de Administração da UFRGS.
Intimidação
De acordo com o professor Ariston, o tempo de trabalho do GT-Ética foi curto demais para alterações substantivas, assim como foram restritos os instrumentos utilizados.
“De maneira ampla mesmo, por exemplo, apenas o Projeto Enquetes – GT-Ética foi de conhecimento geral por parte dos servidores, pois receberam diversos e-mails solicitando que respondessem a um conjunto de situações e questões específicas sobre ética no serviço público. Fora esse projeto, o GT-Ética realizou estudos e relatorias técnicas sobre assuntos, como nepotismo, assédio, resolução consensual de conflitos éticos, redes sociais, rito processual e brindes, além de entrevistas com especialistas e autoridades públicas relacionadas ao tema, tais como juristas, membros da academia, ex-Ministros de Estado, ex-Conselheiros da Comissão de Ética Pública, agentes públicos de empresas estatais e de entes subnacionais, especialistas da sociedade civil e de organismos internacionais, bem como agentes públicos operadores da ética e autoridades públicas federais de áreas pertinentes ao assunto”.
Em março, o governo federal reencaminhou para todos os trabalhadores do serviço público, sem qualquer explicação ou contextualização, o Manual de Conduta do Agente Público Civil do Poder Executivo. O documento foi publicado em junho de 2020 pela Secretaria Especial de Desburocratização, Gestão e Governo Digital do Ministério da Economia, quando já tinha sido enviado ao quadro, e chamou a atenção ter sido novamente disparado em tempos de ataques massivos a servidores e servidoras.
A mensagem chegou poucos dias após a divulgação de que os professores Eraldo dos Santos Pinheiro e Pedro Hallal, respectivamente ex-Pró-reitor e ex-reitor da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), assinaram termo de ajustamento de conduta (TAC) em decorrência de tecerem críticas a Bolsonaro em uma atividade em redes sociais vinculadas à UFPel.
“A expectativa que se tem agora com a proposta formulada pelo GT-Ética, não é a de que ela seja apenas uma reapresentação em linguagem de mais fácil acesso ao servidor público em geral, como no caso daquele Manual de Conduta, mas traga novas interpretações e, inclusive, alterações no conteúdo dos principais normativos do comportamento moral e ético do servidor. Em qual profundidade exatamente, ainda não sabemos”, analisa o professor Ariston.