Redução de salários é barrada, mas PEC do orçamento de guerra drena recursos públicos para os bancos

Os servidores públicos tiveram uma vitória contra a redução dos seus salários na última sexta-feira (3), quando o Congresso barrou emendas sobre o assunto que constavam na PEC do orçamento de guerra. Porém, a Proposta, que permite que os gastos com o enfrentamento da crise do Coronavírus sejam contabilizados à parte do Orçamento da União, segue gerando incertezas e ameaças ao serviço público e aos direitos essenciais da população.

Para o ANDES-SN, são diversos os elementos preocupantes na PEC 10/2020, em especial o substitutivo que cria o Comitê de Gestão da Crise, responsável por aprovar as ações do regime emergencial: criar, eleger, destituir e fiscalizar.

“Da mesma forma, consideramos que a autorização dada ao Banco Central para comprar e vender direitos creditórios e títulos privados de crédito em mercados secundários implica numa saída para preservar os privilégios das elites econômicas e banqueiros, não atacando o que efetivamente estrangula o orçamento da União, estados e municípios, que são a dívida pública e a emenda constitucional 95 (EC/95) e suas variações estaduais”, alerta o Sindicato Nacional, que convoca a categoria a manter as mobilizações via redes sociais com a pauta em defesa do SUS, da educação e pesquisa públicas, e em defesa da vida.

Auditoria Cidadã da Dívida repudia PEC

Na terça-feira (07), a Auditoria Cidadã da Dívida (ACD) também se manifestou contra a PEC 10/2020, em nota técnica. A entidade repudia principalmente os parágrafos 7º e 9º do Art. 115 que a PEC 10/2020 pretende introduzir ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. O artigo 9º autoriza o Banco Central a “comprar e vender títulos de emissão do Tesouro Nacional, nos mercados secundários local e internacional”. Já o artigo 7º “legaliza”  a emissão de títulos da dívida pública para pagar juros da dívida que, segundo a ACD, crescerão vultosamente com as operações nos mercados secundários.

Para a associação, trata-se da “mais escandalosa transformação de dívidas privadas em dívida pública, por meio de operação em que um banco intermediário é que vai ganhar nas duas pontas do negócio”.

A entidade também condena a pressa em consagrar a medida, que foi protocolada na Câmara dos Deputados na quarta-feira (01) e votada na sexta-feira (03), sendo encaminhada ao Senado nesta segunda-feira (07) para votação virtual igualmente apressada.

Para a Auditoria, a alegada “urgência” não possui justificativa técnica, jurídica ou financeira para garantir o pagamento de R$ 600 aos mais pobres, tendo em vista a existência de mais de R$ 1,4 trilhão no caixa do Tesouro Nacional, mais de US$ 340 bilhões em reservas internacionais e cerca de R$ 1 trilhão no caixa do Banco Central, “que está sendo usado para remunerar ilegalmente a sobra do caixa dos bancos e que deveria ser imediatamente liberado para que os bancos possam conceder empréstimos a juros próximos de zero, como está acontecendo no mundo todo”.

No documento, a coordenação da Auditoria exige a imediata suspensão do pagamento dos juros e encargos da dívida pública “para que os recursos se destinem a garantir a vida das pessoas nesse momento de pandemia, conforme petição pública que já conta com milhares de assinaturas”.

Medida desnecessária

A Associação da Auditoria de Controle Externo do Tribunal de Contas da União (AUD-TCU) também avalia que não há necessidade de implementar a PEC.  “A proposta flexibiliza normas de finanças públicas e institui um regime extraordinário fiscal e de contratações para atender às medidas emergenciais de combate ao coronavírus. Além disso, restabelece o orçamento monetário que vigeu na década 1970, o que acarreta  descrédito do Orçamento Geral da União”, pontua nota técnica enviada ao TCU e a parlamentares, citada em coluna da jornalista Rosana Hessel, do Correio Braziliense.
Além disso, a votação só vai fazer o Congresso perder tempo precioso, que poderia ser usado em matérias mais urgentes.  “O governo não precisa de PEC para gastar mais. Tudo isso dá para resolver por meio de lei complementar. Analisamos item por item do projeto”, destaca a presidente da AUD-TCU, Lucieni Pereira.

Para ela, o governo está num jogo de que não pode fazer nada enquanto não tiver a emenda, a qual seria desnecessária. “Basta uma lei complementar ou lei ordinária”, explica.

Distorção

Na avaliação de Lucieni, a PEC 10/2020 ainda distorce a função do Banco Central, permitindo a compra de “títulos podres” de empresas privadas, em vez de capitalizar o BNDES, para que empreste às empresas a juros e condições compatíveis com a crise sanitária mundial. “É preciso tomar muito cuidado com essas propostas que vão na contramão da responsabilidade fiscal”, alerta.

“Essa proposta legislativa é a própria confissão da ilegalidade das citadas operações (entre outras) que desviam grandes volumes de recursos públicos sem justificativa, sacrificando o orçamento público para garantir lucros cada vez maiores aos bancos, às custas da pobreza e miséria que aumentam de forma galopante no Brasil”, acrescenta nota técnica da Auditoria Cidadã da Dívida.

Como combater a pandemia?

“Entendemos que a saída para a crise atual passa pela imediata revogação da EC/95, assim como pela suspensão do pagamento da dívida pública. Também consideramos emergência uma ação que vise taxar as grandes fortunas, pois quem deve pagar pela crise é o setor financeiro e a agiotagem nacional e internacional”, esclarece o ANDES-SN.

O ANDES-SN e o ANDES/UFRGS defendem o fim da EC 95 e a revisão da dívida pública como ações econômicas para o fortalecimento do SUS e da universidade pública no combate à pandemia. Nesta quarta-feira, o ANDES-SN iniciou uma campanha visual intitulada “Como o governo pode combater a pandemia da Covid-19”. Acompanhe a campanha no nosso Facebook.