Cerca de 400 pró-reitores de Pós-graduação e Pesquisa de 248 universidades brasileiras emitiram nota de repúdio a uma apresentação que teria sido distribuída por membros do governo a deputados e senadores a fim de angariar apoio para a proposta de fusão da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Segundo o jornal O Estado de S. Paulo, o material mostra “bolsistas que pesquisam questões de gênero e ditaduras militares latino-americanas”.
A nota é assinada pelo Encontro Nacional de Pró-Reitores de Pesquisa e Pós-Graduação, que ocorreu entre segunda (11) e quinta-feira (14) no campus da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj). Realizado anualmente desde 1985, foi no encontro que se iniciaram as articulações para fundar o Fórum Nacional de Pró-Reitores de Pesquisa e Pós-Graduação (Foprop).
Fusão rejeitada
Elaborada pelo Ministério da Educação (MEC), ao qual está vinculada a Capes, a proposta de junção das duas agências é amplamente rejeitada por lideranças na comunidade científica, além de ser criticada também pelo Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC) – ao qual está subordinado o CNPq. A ideia só é apoiada pelo Ministério da Economia, que sugere que o órgão resultante da pretendida fusão seja subordinado diretamente à Presidência da República.
Para as pastas de Educação e Economia, a medida promoveria racionalização de recursos e eficiência administrativa. No entanto, o MCTIC alerta que não haveria economia significativa, apenas prejuízo ao trabalho das agências, cujas atribuições no financiamento da ciência são diferentes: enquanto o CNPq trata diretamente de programas e projetos de pesquisa, a Capes trabalha com foco na qualificação de pessoal por meio da pós-graduação.
Em outubro, a Academia Brasileira de Ciências (ABC), a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e outras 45 entidades acadêmicas e científicas já haviam divulgado carta contra a fusão. Também se manifestaram, na semana passada, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e 23 das 30 lideranças da Casa, em artigo no jornal O Globo.
Confira a íntegra da nota dos pró-reitores
Segundo noticiado pelo jornal O Estado de São Paulo há alguns dias, um dossiê sobre as atividades de bolsistas de produtividade do CNPq especializados em temas como relações de gênero e ditaduras militares tem circulado no Congresso Nacional, a fim de angariar apoio para a proposta de fusão daquela agência com a CAPES.
O dossiê contém fotos dos referidos pesquisadores e prints de redes sociais que documentam sua participação em eventos acadêmicos.
O manifesta seu repúdio a esse tipo de procedimento, que viola o princípio constitucional da livre expressão da atividade intelectual.
A tentativa de desqualificar trabalhos científicos cuja qualidade e relevância foi reconhecida em processos de avaliação rigorosos e competitivos afronta a comunidade acadêmica brasileira como um todo.
Além disso, a exposição pessoal indevida atenta contra a própria segurança dos colegas submetidos a essa tentativa grotesca de intimidação.
Que expedientes como esses sejam utilizados no intento de defender uma proposta de reorganização institucional que viria a ter impacto profundo e negativo no sistema nacional de pesquisa, pós-graduação e inovação, só comprova que os seus promotores desconhecem os princípios mais elementares da ética científica.
Rio de Janeiro, 13 de novembro de 2019