O Instituto de Biociências da UFRGS (IBIO) elaborou carta manifestando extrema preocupação com o futuro do Museu de Ciências Naturais (MCN), da extinta Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul (FZB-RS). A instituição, que abriga o maior acervo científico de espécies de plantas, animais e fósseis do estado, está com a continuidade ameaçada em função de um processo que trata da estabilidade dos funcionários das fundações fechadas pelo governo estadual.
Com viés de petição pública, o documento se dirige ao governador gaúcho, Eduardo Leite, à Secretaria do Meio Ambiente (Sema) e ao Ministério Público. O texto condena a possibilidade de demissão da totalidade de pesquisadores e técnicos do Museu, que possui um quadro extremamente qualificado para a pesquisa e preservação do patrimônio ambiental e que dá acesso ao acervo para cientistas e estudantes de dentro e fora do Brasil.
“Caso se concretize a demissão do pessoal responsável pela pesquisa e conservação do acervo das coleções científicas, podemos considerar como certa a perda total ou parcial dos acervos pela descontinuidade da sua manutenção”, alerta a carta.
O IBIO lembra, também, que a Lei 14.982, de 16 de janeiro de 2017, “considera que o Museu de Ciências Naturais e os dois órgãos irmãos da então FZB integram o Patrimônio Ambiental do Rio Grande do Sul, cuja preservação e proteção são de interesse público em razão do valor ambiental, científico, educacional e paisagístico”.
Processo no STF
A FZB foi oficialmente extinta em maio de 2020, depois de quase quatro anos de um imbróglio iniciado em 2016 pelo então governador José Ivo Sartori, que enviou à Assembleia Legislativa projeto propondo a extinção de 11 órgãos ligados ao Executivo, dentre eles alguns ligados à pesquisa, como a FZB e a Fundação de Economia e Estatística e à cultura, como a Fundação Piratini.
Desde outubro de 2018, os servidores da entidade integram um “quadro especial” vinculado à Sema. Até agora, eles não podiam ser exonerados em função de uma ação em andamento no Supremo Tribunal Federal.
O julgamento do processo, a cargo do ministro do STF Gilmar Mendes, está marcado para sexta-feira (6) – um dia depois do aniversário de 65 anos do MCN. “Não podemos encerrar esta história com um legado tão negativo de perda do patrimônio científico e cultural de Estado que pretende ser pujante no seu desenvolvimento científico e tecnológico”, alerta o IBIO.
Perdas para o Ensino e a Pesquisa
Conforme a professora do IBIO Laura Verrastro, muitos alunos das universidades gaúchas, em especial da UFRGS, realizam estágios de iniciação científica com os pesquisadores do Museu, além de desenvolver estudos que trazem grande aporte ao conhecimento da sistemática e da história natural e contribuem para a conservação da biodiversidade.
“É na Fundação Zoobotânica que se elaboravam as políticas de conservação da fauna e flora, como o zoneamento ambiental e lista de espécies ameaçadas. A extinção destas atividades seria de grande prejuízo ao Estado em termos ambientais”, acrescenta a docente, frisando que fechamento do Museu deixaria um grande vazio na formação de alunos e pesquisadores.
Além da importância científica e da preservação dos acervos biológicos, o papel do MCN envolve a educação ambiental. “Através das visitas guiadas de escolas ao museu, às exposições e ao Jardim Botânico, por exemplo, os pesquisadores despertavam nas crianças e nos jovens a valorização do ambiente natural e da sua importância para a vida”, aponta a professora Mara Ritter, também do Instituto.
Ela lembra que, assim como o Herbário da UFRGS, o Herbário Professor Dr. Alarich Rudolf Holger Schultz, do Museu, integra a rede de Herbários do RS com um importante acervo – consultado, inclusive, por alunos do IBIO. Entre os diferenciais, está uma coleção de referência de espécies ameaçadas de extinção no Rio Grande do Sul, que é preservada em meio a instalações precárias.
“O desmonte e as limitações financeiras que os pesquisadores têm enfrentado é geral no Museu, o que influencia muito a pesquisa”, lamenta a docente, destacando que os profissionais quase não conseguem mais realizar saídas de campo, fundamentais para a área biológica, além de lidarem diariamente com infiltrações e goteiras, que põem em risco as coleções. Conforme informações institucionais do MCN, atualmente existem mais de 432 mil exemplares de animais, plantas e fósseis catalogadas na instituição.