Mais uma vez, a reitoria interventora faz pouco caso de garantir condições e se exime de sua responsabilidade, suspendendo as atividades acadêmicas por quase dois meses em razão das enchentes e seus impactos, a retomada das aulas da graduação na UFRGS está prevista para 1º de julho, com a perspectiva ainda não confirmada de um calendário letivo reduzido de 19 para 15 semanas. As Normas Educacionais Excepcionais (NEE) aprovadas pelo CEPE preveem alguns cuidados para reduzir os prejuízos dos estudantes, como a possibilidade de cancelamento de matrícula e de solicitação de programas individualizados de estudos. Preveem também ampla flexibilidade na reorganização das atividades de ensino, com a adoção de atividades pedagógicas não-presenciais.
A redução de carga horária, a despeito dos conteúdos já programados, pretensamente legitimada por uma enquete on-line, tem limites impostos pela calamidade inviabilizam a participação justamente de quem mais foi afetado. A consulta foi feita em uma plataforma externa à UFRGS que exigia um login pouco usual à comunidade universitária. Tampouco foi acompanhada de informações sobre a elevação da carga horária semanal de docentes e discentes, mas, principalmente, não houve escuta recíproca sobre a viabilidade dessa aceleração em atividades de ensino que são cruciais para a formação dos estudantes, como preparação para a continuidade de estudos ou para atividades profissionais.
Entretanto, não há ações concretas da Administração Central da Universidade para viabilizar de fato o retorno, quando o transporte coletivo, que já era insuficiente, foi severamente afetado, com redução de itinerários, horários e consequente aumento de custos. Tampouco há ações efetivas por parte da Administração para viabilizar a participação discente em atividades não presenciais.
Conforme as NEE, não pode haver conceito FF neste e no próximo semestre, o que libera o controle de frequência. Assim, nenhum aluno pode ser penalizado se não comparecer às atividades presenciais não avaliativas, favorecendo aqueles que terão dificuldade de acessar a universidade, mas ao mesmo tempo, desestimulando a frequência geral, o que vai ser agravado com as atividades remotas.
Dos tempos da pandemia, já sabemos que as condições de acompanhamento dessas atividades eram inadequadas para ampla parcela, fosse pela inexistência ou precariedades dos equipamentos ou das redes, ou pela falta de espaços e tempos adequados para estudo fora dos campi. Hoje, depois das muitas perdas havidas, e do importante engajamento de muitos em ações solidárias, essas condições estão ainda mais precárias.
Quanto ao trabalho docente, será intensificado com a exigência de viabilizar as mesmas aprendizagens e carga horária de estudo num tempo bastante reduzido, e com a demanda de planejamentos individualizados.
Assim, depois de dois meses de muitas ações de solidariedade para mitigar os efeitos das inundações, temos uma previsão de retorno em que cada docente será pressionada(o) a lidar individualmente com a sobrecarga de trabalho inerente às NEE e ao calendário reduzido, com prejuízos que incidirão também sobre as aprendizagens, os índices de aprovação e de permanência dos discentes.
Considerando que cada estudante cursa aproximadamente 4 disciplinas simultâneas, pode ocorrer um acúmulo de atividades autônomas para dar conta de todo o conteúdo das 19 semanas em apenas 15. O que se assevera se consideramos que 6 semanas já foram cursadas antes das enchentes e restam apenas 8 semanas de conteúdo e 1 de recuperação.
Há certo prejuízo e, possivelmente, acarretará algum descaso com as atividades curricularizáveis, além da inflexibilidade em relação aos estágios obrigatórios, quem implicam seus processos institucionais e de supervisão pedagógica.
As mudanças climáticas têm exigido da Universidade a participação ativa e decisiva na busca de conhecimento e de soluções. O retorno às aulas deve ser feito também com escuta recíproca e solidariedade na construção do melhor calendário, dos planejamentos modificados, e com a busca de soluções que pressupõem o conhecimento das condições de cada atividade, professor e turma.
Defendemos um processo amplo de escuta e de diálogo das diversas instâncias da Universidade, entre colegas nos departamentos, entre docentes, discentes e técnicos-administrativos em educação e entre professores e os estudantes de suas turmas para que o planejamento das atividades na continuação do semestre não prejudique justamente a quem deveria possibilitar a retomada.