O projeto de Reforma Administrativa, enviado pelo governo federal ao Congresso na semana passada, é mais um ataque à classe trabalhadora. Com foco na retirada de direitos e garantias e no desmonte das políticas públicas, a mudança, se aprovada, promoverá a desestruturação dos serviços públicos, em especial daqueles relacionados aos direitos sociais garantidos constitucionalmente à população.
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 32/2020, que já vinha há tempos sendo anunciada pelo Executivo e pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, se apresenta como um texto que necessita de muitas Leis Complementares para se efetivar – o que em si já é um grande risco, pois a tramitação das leis complementares pode acarretar novas perdas de direitos que sequer estavam previstas no texto-base da PEC.
Além disso, a PEC corre paralelamente à proposta de novo corte no orçamento da Educação pública em 2021, prevista no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) – que chegaria a R$ 4,2 bilhões, dos quais R$ 1 bilhão atingiriam universidades, institutos federais e cefets. Na visão do Sindicato Nacional, ambas representam lutas centrais a serem travadas nesse momento pelo conjunto dos servidores públicos, em articulação com movimentos sociais e demais categorias, uma vez que a desestruturação dos serviços públicos afeta toda a sociedade.
Uma síntese das principais alterações
Fausto Augusto Jr., Diretor técnico do DIEESE, afirma que “muito mais do que uma reforma administrativa, o que o governo propõe é uma reforma de Estado. A proposta que está aqui, é tirar a estabilidade do servidor público de um lado, reduzir salários, na outra ponta e, onde e sempre, reduzir os salários daqueles trabalhadores que ganham menos, porque as carreiras típicas do Estado (juízes, parlamentares, o conjunto de servidores que mais têm remuneração) pouco serão atingidos”.
Para o ANDES-SN, “a PEC abre espaço para a terceirização irrestrita em todas as áreas. Possibilita, ainda, à União, aos estados, ao Distrito Federal e aos Municípios fecharem contratos de cooperação com órgãos e entidades, públicos e privados, para a execução de serviços públicos, inclusive com o compartilhamento de estrutura física e a utilização de recursos humanos de particulares, com ou sem contrapartida financeira”.
O Sindoif, Seção Sindical do ANDES-SN, faz um alerta em matéria sobre o tema de que “ainda que se avalie que alguns aspectos da proposta não seriam aplicáveis aos atuais integrantes do serviço público de forma direta, por ressalvas contidas no próprio texto da PEC, é imperioso citar que algumas destas proposições não deixam margem para muito otimismo em relação ao futuro”. Algumas propostas que indicam que “não se aplica um determinado mecanismo contido na PEC, desde que haja previsão em legislação anterior, acaba finalizado pela expressão exceto se houver alteração ou revogação da referida lei”.
Poder centralizado, direitos prejudicados
A PEC atinge tanto quem está na ativa quanto àqueles que ingressarem depois de sua aprovação. Um dos ataques mais contundentes é o fim do Regime Jurídico Único, precarizando as formas de contratação – como em caráter temporário e em regime de experiência –, prejudicando a qualidade dos serviços prestados à população e, ainda, abrindo as portas para a terceirização irrestrita em todas as áreas.
Outro ponto afetado é a regra para promoções ou progressões, que passariam a ser exclusivamente por tempo de serviço. Além disso, fica vedada a redução de jornada sem redução de remuneração, a incorporação de cargos em comissão ou funções de confiança à remuneração permanente, enquanto a aposentadoria compulsória passa a ser aos 75 anos.
O texto também trata da instituição de parcerias público-privadas (PPPs), inclusive com o compartilhamento de estrutura física e a utilização de recursos humanos de particulares – com ou sem contrapartida financeira. Ainda cria novos regimes de previdência e retira dos atuais servidores e de empregados públicos benefícios que eventualmente não estejam previstos em lei até 31 de agosto de 2021.
A centralização do poder no presidente da República também faz parte do escopo da Reforma, cujo texto prevê outorgar ao Executivo a permissão para criar, fundir, transformar ou extinguir cargos de Ministérios e de órgãos diretamente subordinados ao chefe do Executivo e entidades da administração pública autárquica e fundacional. O presidente poderá, também, transformar cargos públicos efetivos vagos, cargos de Ministro de Estado, cargos em comissão e cargos de liderança e assessoramento, funções de confiança e gratificações de caráter não permanente, vagos ou ocupados, e alterar e reorganizar suas atribuições.
Campanha Em defesa dos Serviços Públicos
O ANDES-SN, juntamente com o Fonasefe e outras entidades, está elaborando uma Campanha Nacional em Defesa dos Serviços Públicos, que envolverá ampla divulgação – através de outdoors, lives, vídeos – e, centralmente, mobilização para o Dia Nacional de Lutas, marcado para 30 de setembro.
O Sindicato Nacional também convoca a categoria a participar da consulta on-line da Câmara dos Deputados sobre o projeto da reforma Administrativa, que pode ocorrer aqui. Para isso, docentes devem votar na opção “discordo totalmente”.
Ainda, uma proposta de carta foi elaborada para ser enviada para Executivo e parlamentares, reforçando os perigos das propostas à sociedade brasileira e convocando o Legislativo a votar contra as mudanças. Veja o texto abaixo:
PROPOSTA DE CARTA À(O)S PARLAMENTARES E AO EXECUTIVO
Senhor(a) Deputado(a) e Senador(a) (ao enviar para o executivo colocar o nome)
No dia 03 de setembro, o Executivo enviou ao Congresso Nacional a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Reforma Administrativa, que pretende mudar a Constituição Federal de 1988 (PEC nº 32/2020), que ataca frontalmente o direito do(a)s servidore(a)s público(a)s e desestrutura as políticas públicas e sociais.
Como professor(a) do ensino superior, área pouquíssimo valorizada por este governo, mas essencial para a construção de um país autônomo, independente e que tenha qualidade de vida para o conjunto da população, estou muito preocupado(a) com as repercussões dessa verdadeira contrarreforma para o conjunto da sociedade e, especialmente, para as instituições públicas de ensino superior (Universidades, Institutos Federais e CEFET).
No mesmo dia que enviou a proposta de Reforma Administrativa ao Congresso – sem nenhum diálogo com as entidades que representam os servidore(a)s público(a)s -, o governo também enviou uma mensagem, via SIGEP, ao conjunto do funcionalismo. Por isso, quero ponderar algumas questões:
1- O governo federal e parte do Legislativo responsabilizam o(a)s servidore(a)s público(a)s pelos altos gastos do Estado. Isto é uma inverdade! Mas deveria ser o contrário, o governo e o(a)s parlamentares deveriam reconhecer que políticas públicas são investimentos em qualidade de vida da população, em direitos, sociais e em produção do conhecimento para o desenvolvimento do país. E que sem servidore(a)s público(a)s, não há política pública de qualidade;
2- O governo usa dados imprecisos e mentirosos sobre os gastos com o funcionalismo público, além de responsabilizar o(a)s servidore(a)s pela inoperância dos serviços prestados, quando, na verdade, sabemos que a dificuldade de funcionamento em algumas áreas é centralmente pelo número reduzido de servidore(a)s e pela desestruturação das políticas públicas. Basta olhar o orçamento do governo para ver os investimentos e verificar que são absolutamente insuficientes para a garantia e execução de políticas públicas de qualidade e universais. Em todos os países do mundo em que as políticas públicas funcionam e são de qualidade há um investimento forte do Estado em carreira de servidore(a)s e estrutura dos equipamentos públicos;
3- O governo tenta dissuadir o funcionalismo público dizendo que o(a)s que já estão não serão afetados. Como não seremos afetado(a)s? Nas instituições onde trabalhamos não teremos mais concursos públicos. Se o(a)s meus(minhas) futuro(a)s colegas vão ser trabalhadore(a)s precarizados (terceirizado(a)s, sem carreira e sem estabilidade); se a pretensão éacabar com o Regime Jurídico Único (RJU) e colocar nossa carreira em extinção; e se vários artigos vão precisar de posterior legislação complementar, deixando absolutamente fragilizados os poucos direitos que ainda temos; como dizer que não seremos afetado(a)s?
4- A PEC nº 32/2020 atinge imediatamente o(a)s servidores público(a)s uma vez que incidirá sobre nós várias das novas regras, entre elas a avaliação por desempenho, desconsiderando que nós já somos avaliado(a)s, periodicamente em nossas instituições;
5- Entendo que a PEC nº 32/2020 pretende reger o funcionalismo público pelas mesmas regras da iniciativa privada, portanto extinguindo o funcionalismo público, com consequências nefastas para os direitos sociais e as políticas públicas. A iniciativa privada é regida pela lógica do lucro e o setor público deve ser regido pela lógica da garantia dos direitos;
6- Existem outras formas do Estado arrecadar, como a taxação das grandes fortunas, a suspensão do pagamento dos juros da dívida pública, a reformulação do sistema tributário, taxando os ricos e não os pobres, entre outros;
7- Desde o inicio deste governo, ao escolher Paulo Guedes para ministro da Economia, concedendo-lhe grandes poderes juntando ministérios, Bolsonaro já explicitou qual seria sua prioridade. A prioridade do governo Bolsonaro são os banqueiros, os empresários e os ricos. E a sua prioridade, senhor(a) parlamentar, é quem? A população, em especial a mais pobre, ou também os banqueiros, os ricos e o capital?
Se sua prioridade é a população, defenda as políticas públicas, os serviços e servidore(a)s público(a)s. São também eles que votam para eleger o parlamento!
Diga NÃO à Reforma Administrativa do governo Bolsonaro!
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