Perdeu a validade nesta terça-feira (2) a Medida Provisória (MP) 914/2019, que dava à Presidência da República a prerrogativa de escolher reitores(as) de universidades, institutos federais de ensino superior e do Colégio Pedro II. De acordo com o prazo regimental da Câmara dos Deputados, o texto deveria ter sido apreciado até a última segunda-feira (1º), o que não aconteceu.
Se aprovada a MP, passaria a ser obrigatória a realização de consulta à comunidade acadêmica para a formação da lista tríplice para o cargo de reitor por votação direta, preferencialmente eletrônica. A consulta não poderia ser feita com voto paritário ou universal, e obrigatoriamente deveria ser realizada com peso de 70% do voto docente, 15% do técnico-administrativo e 15% para discentes, criando mais um entrave ao fortalecimento da democracia interna das Universidades. A mesma regra seria imposta aos Institutos Federais, que possuem regramento mais progressista em relação ao tema e não precisam submeter ao presidente da República uma lista tríplice para a escolha de seus Reitores.
O texto estabelecia ainda que o presidente poderia nomear reitores pro tempore em “razão de irregularidades verificadas no processo de consulta”. Tal intervenção ocorreu, por exemplo, na Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) e no Cefet-RJ.
Danos da MP são irreparáveis
Desde o início do governo Bolsonaro, o ataque à autonomia universitária tem sido sistemático, com seguidas tentativas de interferir na independência pedagógica e desrespeito às consultas às comunidades acadêmicas para escolha dos reitores.
Para Antonio Gonçalves, presidente do ANDES-SN, a perda da validade da MP recoloca as universidades em um patamar anterior que tampouco é satisfatório, pelo obstáculo ao pleno exercício da autonomia das instituições públicas de ensino superior. O Sindicato Nacional vem lutando publicamente pela democracia nas IFEs, com a defesa histórica do voto paritário e o respeito à decisão da comunidade acadêmica na escolha de reitores, sem interferência dos governos na sua nomeação.
“Os danos provocados pela MP 914 não poderão ser sanados, pois as nomeações ocorridas não serão revistas. Preocupam-nos as consultas previstas para o período de isolamento social e as seções sindicais devem estimular esse debate conforme o cenário local, diante da diversidade que há nas IES”, explica o presidente do Sindicato Nacional. A UFRGS pode ser afetada pela perda de validade da MP, pois a consulta à comunidade para a escolha de reitor está prevista para acontecer em outubro e o Edital deve ser lançado nos próximos dias.
Resistência contra retrocessos
Gonçalves reforça que é fundamental que a categoria se mantenha atenta e em luta para resistir aos retrocessos e ataques à autonomia universitária e avançar para que a escolha dos dirigentes se dê sem interferência do governo federal. “A nossa luta continua no sentido de garantir que a escolha de gestores encerre-se no âmbito das IES, através de eleições diretas, com voto paritário ou universal”, reforça.
A importância da autodeterminação da comunidade universitária na escolha de seus dirigentes também é destacada por Vicente Ribeiro, Coordenador Geral da seção Sindical do ANDES-SN na UFFS (Sinduffs) e membro do Conselho Universitário na instituição: “Especialmente neste momento, devemos fazer uso da autonomia universitária para ampliar regulamentações que aprofundem princípios de gestão democrática no âmbito das próprias IFEs”. Ribeiro lembra que a comunidade acadêmica da UFFS segue contestando a intervenção na posse do reitor em agosto de 2019 e reivindicando a destituição do nome escolhido por Jair Bolsonaro.
Outras intervenções que contrariam a autonomia das instituições de ensino já ocorreram na UFC, na UFGD, na UFTM, na UFRB, na UFVJM, na UFC, na UFES e na UFFS. Além disso, em abril de 2019, a interferência do governo resultou em alteração na composição da lista tríplice na eleição da Unirio, o que levou à nomeação de um reitor que nem sequer participou da votação.
Os princípios de fortalecimento da democracia interna nas IFEs defendidos pelo ANDES-SN, como o voto universal ou paritário, construídos a partir de debates na base do Sindicato e consensuados nos Congressos, estão sintetizados no Caderno 2 – volume que reúne as propostas da entidade para a universidade brasileira.
O ANDES/UFRGS está atento aos movimentos do governo federal e participa com as entidades representativas dos técnico-administrativos em educação e dos estudantes de graduação e pós-graduação de discussões sobre o tema.