Greve suspende temporariamente processo de privatização da Carris

Em resposta à greve dos rodoviários da Carris, o prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo, retirou de votação, temporariamente, o PL 013/21, de privatização da empresa. O texto já havia sido aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, e seguiria para votação em plenário em regime de urgência.

Com a suspensão provisória da pauta, a categoria voltou ao trabalho na terça-feira (24), mas segue em estado de greve até receber mais explicações sobre o plano do governo, que também prevê a redução gradual do quadro de motoristas e cobradores.

Carlos Schmidt, secretário adjunto dos transportes do município e membro do conselho diretor da Carris em 1989 e 1990, explica a importância da empresa para a população: “A Carris era uma empresa privada estrangeira que foi estatizada pelo governo Leonel Brizola nos anos 1950. A estatização permitiu o planejamento do transporte público e o reconhecimento de trajetos de ônibus e de horários que atendiam as necessidades dos usuários e que as empresas privadas não tinham interesse em atender.” Professor aposentado da Faculdade de Ciências Econômicas (FCE), Schmidt alerta para os efeitos da privatização: “Muitas linhas de ônibus que foram assumidas pela Carris, com o tempo, se tornaram lucrativas. As empresas privadas estão interessadas nessas linhas, sem compromisso com o conjunto dos serviços que a Carris oferece e, portanto, com importante prejuízo para os usuários do transporte.”

“A condução do movimento em defesa da Carris Pública e da Luta Contra a Extinção dos Cobradores realizada pelo Stetpoa Sindicato (Sindicato dos Trabalhadores de Empresas de Transporte em Porto Alegre) foi sempre na certeza de buscar soluções e amparo para o trabalhador rodoviário, acima de tudo garantias pertinentes e que sabidamente são viáveis, mas fazendo isso num debate equilibrado e que contemplasse a classe trabalhadora, afinal, enfrentamos uma pandemia e, sabidamente, os trabalhadores rodoviários foram grandiosos no cumprimento deste papel”, afirma o Stetpoa.

Segundo a entidade, os projetos de lei apresentados pelo Executivo impactariam fortemente na cidade, “e Melo sabe disso, porém, não concedeu espaço adequado ao debate público e a devida amplitude para que a população e suas representações decidam junto aos parlamentares”.

Empresa de transporte coletivo mais antiga do país

Criada pelo Decreto nº 4.985, assinado por Dom Pedro II em 19 de junho de 1872, a Carris é a empresa de transporte coletivo mais antiga do país em atividade, e atende mais de 110 mil passageiros/dia. Atualmente, a companhia é responsável por 24 linhas na capital gaúcha, com frota total 347 veículos – destes, 315 estão em operação e 89% têm acessibilidade.

“A Carris sempre foi sinônimo de inovação e qualificação no transporte público de passageiros, tendo obtido reconhecimento nacional e internacional. Suas iniciativas de atendimento aos usuários, renovação da frota, uso de tecnologias de acessibilidade e preservação do meio ambiente foram fundamentais para que as empresas privadas, que também operam no transporte coletivo da Capital adotassem melhorias”, previne o Sindicato dos Municipários de Porto Alegre (Simpa) em apoio ao movimento paredista.

“Privatizar a Carris é tornar a população de Porto Alegre refém das empresas privadas que operam o transporte coletivo, um dos mais caros do país e com menor retorno de qualidade para os usuários”, acrescenta a nota.

Artimanhas

A greve só foi deflagrada porque Melo mandou colocar ônibus das linhas 343, T5 e T2A circulando sem cobradores e com preço da passagem reduzido. Essa medida foi interpretada como uma declaração de recusa ao diálogo, pois a categoria também se opõe ao Projeto de Lei 016/21, que propõe a retirada gradual dos cobradores dos ônibus da cidade.

Conforme informações da imprensa, também houve corte de ponto e dos benefícios relativos ao dia parado.

Em rede social, o prefeito criticou a greve, alegando ter sido feita em um momento inoportuno “em que a cidade busca retomar a normalidade”. Segundo o governante, que chegou a sugerir uma “intervenção militar” na Carris, “ainda há muita gente desempregada e aqueles que possuem salário em dia, às custas do erário público, cruzam os braços”.

Na quinta-feira (26), representantes do Stetpoa e de funcionários(as) se reunirão para discutir as propostas e os rumos do movimento.

O ANDES/UFRGS manifesta total apoio à categoria e à defesa da Carris como empresa pública e de qualidade. Contra a privatização e a exploração de trabalhadoras e trabalhadores!