Faltando doses para grupos de risco, governo federal incentiva a iniciativa privada a comprar vacinas

Em meio às indefinições sobre o Plano Nacional de Vacinação e à falta de doses até mesmo para os grupos prioritários no país, o governo Bolsonaro manifestou apoio à compra de imunizantes pela iniciativa privada, ameaçando a continuação da suposta fila definida pelo próprio Ministério da Saúde.

A declaração do presidente da República foi feita nesta terça-feira (26), em alusão à intenção de um grupo de empresas brasileiras que estaria tentando adquirir 33 milhões de doses da vacina desenvolvida pela Universidade de Oxford e pela biofarmacêutica AstraZeneca, com a promessa de doar metade ao SUS.

“Com 33 milhões de doses de graça no Brasil para nós, ajudaria e muito a economia e para aqueles que também queiram porventura se vacinar o façam, para ficar livre do vírus”, declarou Bolsonaro durante evento virtual de um banco de investimentos.

“Rapidamente aquela parte da mídia, que você sabe como funciona, quer que dê errado para atingir o governo, falam em fura fila”, seguiu Bolsonaro, ignorando que, em pelo menos dez estados, denúncias já motivaram os ministérios públicos estaduais e federal a cobrar explicações dos governos sobre irregularidades na aplicação.

O plano de importação privada foi noticiado pela Folha de S.Paulo, citando corporações como Bradesco, Cyrela, Latam e Ambev. Na prática, isso permitiria a imunização fora dos grupos prioritários e diminuiria a disponibilidade de compra de vacinas por governos – entre eles, o brasileiro.

A AstraZeneca divulgou nota desmentindo a negociação. “No momento, todas as doses da vacina estão disponíveis por meio de acordos firmados com governos e organizações multilaterais ao redor do mundo, incluindo da Covax Facility, não sendo possível disponibilizar vacinas para o mercado privado”, diz o comunicado.

A Pfizer também negou participação, alegando que o imunizante “é um bem que deve ser oferecido à população em geral” e se dizendo comprometida a trabalhar em colaboração com os programas nacionais.

Outros empresários também estão interessados no tema. Em uma live com ex-ministros de Saúde no último dia 20, a empresária Luiza Trajano, do Magazine Luiza, afirmou que é hora de “acudir” e que uma reunião de empresários deve acontecer nos próximos dias para debater e entender o que a sociedade civil pode fazer, “porque não é só entregar a vacina, é toda uma logística, é todo um equipamento. Se unindo é o único jeito da sociedade civil levantar alternativas”.

Negociações anteriores

No início de janeiro, uma comitiva formada por representantes de clínicas particulares de vacinação já havia anunciado a intenção de adquirir 5 milhões de doses da vacina Covaxin, do laboratório indiano Bharat Biotech. A fórmula ainda não foi liberada pela Anvisa, mas já teve seu uso emergencial aprovado no país asiático.

Na interpretação do ANDES-SN, privatizar a compra do imunizante pode, mais uma vez, prejudicar a parcela mais pobre e desassistida da população.  “Essa vacina deve ter um plano nacional de imunização, organizado pelo governo federal, deve ser produzida e financiada pelo Sistema Único de Saúde, com valorização dos nossos centros de ciência e pesquisa, dos nossos cientistas”, afirma Rivânia Moura, presidenta do Sindicato Nacional.

A entidade convoca toda a categoria a participar da Jornada Nacional de Lutas em defesa dos serviços públicos, da vida a à frente dos lucros, e pela vacinação imediata de toda a população, que acontece até o dia 1º de fevereiro no país. “É urgente e necessário que a gente encabece essa mobilização”, acrescenta Rivânia. Confira aqui a programação.

Abrace a vacina

Criada pelo coletivo Direitos Já! Fórum pela Democracia e da Frente pela Vida, com o apoio de diversas entidades, movimentos e organizações da sociedade civil, a campanha Abrace A Vacina foi lançada no último dia 18, data do início da vacinação no Brasil. O objetivo da inciativa é disseminar entre a população informações sobre segurança e eficácia da imunização contra o novo coronavírus.

Buscando dialogar com toda a sociedade brasileira, independentemente de posicionamento político ou ideológico e evitando difundir conteúdos que sejam a favor ou contra governos, gestores, personalidades ou partidos políticos, o Conselho Nacional de Saúde (CNS) convoca todas as entidades que integram o controle social da Saúde para participarem ativamente da ação para construir a imunização coletiva, com máxima amplitude.

Para as entidades participarem, basta preencher o formulário de adesão e divulgar nas redes informações técnicas, além de fotos e depoimentos em vídeo, sempre utilizando a hashtag #AbraceAVacina. Os materiais estão disponíveis no Telegram e no site da campanha.