Entidades e coletivos solicitam audiência para debater revitalização do Cais Mauá

 

Com o objetivo de levar propostas para recuperação e utilização do Centro Histórico em conjunto com o Cais Mauá, o ANDES/UFRGS, juntamente com mais 58 entidades e coletivos, assinou Carta Aberta direcionada ao governador Eduardo Leite, solicitando audiência para discutir a revitalização do local. O pedido foi protocolado em 22 de dezembro, e, no dia 8 de janeiro, nova solicitação foi dirigida ao prefeito Sebastião Melo. Ambos seguem sem resposta.

Os diálogos sugeridos pretendem construir proposições que tenham como diretrizes a integração da área com o Centro da cidade, seu uso democrático, sua vocação cultural, a sustentabilidade ambiental e econômica e a manutenção do patrimônio cultural. “Algumas experiências culturais podem ser aproveitadas, como é o caso do Condomínio Cênico São Pedro”, sugere Jacqueline Custodio, mestranda do PPG Museologia e Patrimônio da UFRGS e uma das articuladoras da mobilização, em artigo publicado neste sábado (6), no jornal Correio do Povo.

Na última quarta-feira (3), foi assinado um contrato entre o governo do Estado e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), para estruturação da modelagem de desestatização do Cais. Até outubro, o novo projeto de revitalização deverá estar concluído, com previsão de publicação do edital para dezembro.

Organizações ligadas ao meio ambiente, à cultura, à defesa dos direitos humanos, à arquitetura e ao patrimônio público do Rio Grande do Sul e do Brasil, criticam a decisão do governador de encaminhar a venda de lotes, defendendo que o espaço seja mantido público.

Além de endereçada ao governador, a carta também é destinada à Presidente do IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), Larissa Rodrigues Peixoto Dutra, ao Superintendente do IPHAN/RS (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional no Rio Grande do Sul), Leonardo Maricato, ao Secretário Municipal de Cultura de Porto Alegre, Luciano Alabarse, à Coordenadora da Memória Cultural da Secretaria, Ronice Giacomet Borges, ao Assessor Especial do Departamento de Memória e Patrimônio, Eduardo Hahn, e à Secretária de Estado da Cultura do Rio Grande do Sul, Beatriz Araújo.

Estatuto da Cidade

Para as associações, ONGs, institutos, fóruns e coletivos que assinam o documento, a proposta de venda em lotes infringe várias normas legais e constitucionais, sendo a violação mais significativa a que se refere ao direito dos cidadãos à cidade. “O Estatuto da Cidade traz, como diretrizes a garantia do direito a cidades sustentáveis, a gestão democrática por meio da participação da população e de associações da sociedade civil e a proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico”, diz a carta.

O texto pontua que “todas as propostas encampadas pelo Governo do Estado até agora tem como cerne a transformação do Cais Mauá em um plano de negócios para a área”, as quais, segundo as signatárias, “pouco dialogaram com a dinâmica da cidade, subavaliando os impactos ambientais, sociais e de mobilidade, ignorando aspectos importantes relacionados ao patrimônio cultural e, acima de tudo, impossibilitando qualquer manifestação democrática da população porto-alegrense acerca dos seus desejos para aquele local icônico da capital do RS”.

Localizado às margens do Guaíba, entre a Usina do Gasômetro e a rodoviária de Porto Alegre, o Cais fica em um terreno de 181,3 mil metros quadrados que pertence ao Estado. Dividido entre armazéns, docas e Gasômetro, o conjunto está avaliado em R$ 600 milhões, segundo laudo do Departamento de Patrimônio do Estado realizado no ano passado.

Falta de diálogo

“Em, pelo menos, duas oportunidades, organizações da sociedade civil gaúcha tentaram uma audiência com o Governador Eduardo Leite, na busca do diálogo para trazer o Cais de volta à população. Mas a porta do Governo do Estado permaneceu fechada em clara afronta às normas democráticas básicas de convivência que regem o Estado Democrático de Direito. Causa estranheza a indisposição do governador do Estado em dialogar, já que contrasta com as atitudes dispensadas às organizações empresariais. Nestas tentativas de diálogo trazíamos propostas de metodologia para que o projeto a ser implantado contemplasse a diversidade de usos do espaço do Cais, incorporado à dinâmica do centro histórico em seus múltiplos aspectos, com acesso de todos e respeitando a paisagem cultural de Porto Alegre”, dizem as entidades.

“Frente à decisão arbitrária de encaminhar a venda de lotes do Cais Mauá e seu uso imobiliário, as organizações e entidades signatárias dessa carta aberta vêm se manifestar pela defesa do Cais Mauá público. Exigimos – conforme prevê o Estatuto da Cidade – a participação da população gaúcha nas decisões que envolvem este símbolo de Porto Alegre, pois é dever do Poder Público a defesa e a conservação de bens significativos da história e da memória de seus cidadãos, assim como o zelo pela supremacia do interesse público. Não assegurar o diálogo com a população sobre um tema que lhe é tão caro e simbólico, é afrontar o fundamento constitucional de cidadania e desprezar a força democrática do voto e sua representação do princípio da supremacia do interesse público”, finalizam.