Encontro nacional destaca urgência da luta pelo fim das intervenções

O “Encontro das Universidades, Institutos Federais e CEFETs em luta contra as intervenções”, deliberado no 40º Congresso do ANDES-SN a partir de um Texto de Resolução proposto por várias Seções de universidades sob intervenção, incluindo a UFRGS, ocorreu nos dias 11 e de 12 de maio, em Brasília.

Estiveram presentes representantes de 30 seções sindicais, além de entidades nacionais como SINASEFE, FASUBRA, UNE, FENET, ASFOC e o Fórum de Reitores e Reitoras eleito(a)s e não empossado(a)s por Bolsonaro. O ANDES/UFRGS foi representado pelos professores Guilherme Dornelas Camara, da Comissão de Mobilização, Maria Ceci Misoczky, secretária da Seção, e Pedro Costa, professor da Escola de Administração.

Desde 2019, pelo menos 27 Instituições Federais de Ensino (IFE) sofreram intervenções, com a nomeação de candidatos que estavam em segundo ou terceiro lugar na lista tríplice ou pela indicação de reitores e reitoras pró-tempore. Vinte e duas universidades federais seguem sob intervenção; sete aguardam a nomeação dos reitores eleitos.

Dossiê Intervenções

Durante o Encontro, foi apresentado o “Dossiê Intervenções”, uma sistematização muito importante realizada pelo Sindicato Nacional que, para Pedro Costa, mostra que a situação na UFRGS é parte de um projeto organizado de ataque à autonomia universitária. “O estudo evidencia que as intervenções se valem e exploram contradições históricas da universidade pública, como os renitentes conservadorismo e elitismo, fragmentações e oportunismos pessoais. Do ponto de vista formal, as intervenções fazem uso da persistência do entulho jurídico-institucional herdado da ditadura e inalterado até hoje”, esclarece.

Segundo o Dossiê, houve diferentes caminhos para realizar esse projeto autoritário nas universidades sob intervenção. “Contudo, fica claro que o caso da UFRGS foi alimentado por um déficit democrático histórico e pelo desprezo de administrações passadas por técnicos e estudantes”, completa Pedro.

“Não há intervenção aceitável”

“O Encontro foi fundamental para termos clareza de que não existe intervenção aceitável, não importa o formato. Sempre que o resultado da escolha pela comunidade não tenha sido respeitado, há uma intervenção que fere a autonomia universitária e cria uma relação de dependência entre quem assume com quem concretizou a nomeação”, explica Guilherme.

Para ele, além de ser um espaço para sistematizar os acúmulos das seções e das comunidades em resistência e luta, o evento foi muito importante para o fortalecimento da categoria, para o avanço de uma agenda focada no combate às intervenções e para prevenir ou apoiar processos de escolha que já se encontram sob ameaça, como na UFSC, ou que realizarão seus processos nos próximos meses. “A articulação das seções sindicais, demandada pelas bases do nosso Sindicato, é um passo fundamental para o enfrentamento do autoritarismo e da violência que são marcas das intervenções”, destaca.

Posse dos eleitos é urgente, luta pela democratização é permanente

Maria Ceci Misoczky esclarece que é indispensável lutar pelos meios políticos, administrativos e jurídicos para interromper as intervenções e para que seja dada posse aos escolhidos em cada universidade. “Isso não significa, no entanto, o final de um processo de luta. Longe disso, a luta pela democratização das relações internas deve prosseguir”, enfatiza.

A professora destaca, ainda, que ficou evidente que o protagonismo do Conselho Universitário na resistência à intervenção e ao desmonte é uma particularidade da UFRGS. “Talvez, essa capacidade de enfrentamento tenha sido forjada em alguns conselheiros pela necessidade, antes da intervenção, de enfrentar, naquela instância, práticas antidemocráticas das quais o exemplo mais evidente é a rejeição a processos paritários na escolha dos dirigentes escudada em argumentos sustentados por uma procuradoria em constante desrespeito à autonomia que não serviram para blindar a universidade de sofrer intervenção”, acrescenta.

“O exemplo da UFRGS de propor a destituição do interventor precisa ser olhado pelas demais instituições, e considero um caminho importante”.

Campanha e agenda de mobilização

O encaminhamento ao final resultou da proposição, realizada por diversas Seções, de que seja realizada uma campanha nacional pelo fim das intervenções, articulando ações concretas em universidades sob intervenção, com a mobilização de todos os segmentos que compõem a comunidade universitária e com articulação com setores da sociedade. Essa campanha deve ser organizada pela Direção Nacional em conjunto com as Seções de universidades sob intervenção e com todas aquelas que se interessarem em participar, já que muitas estão ou estarão em risco nos próximos meses. Outra frente de ações refere-se à necessidade de revogar as normativas legais vigentes, tendo como referência as que apontam os documentos históricos do ANDES-SN: escolha dos dirigentes pela comunidade universitária em eleições diretas, no mínimo paritárias; respeito aos resultados dos processos eleitorais em que a comunidade universitária escolhe os dirigentes, garantindo a sua homologação no âmbito da própria instituição.

Revogação do entulho autoritário

Elisabete Búrigo, vice-presidente do ANDES/UFRGS, participou da mesa “O ANDES-SN e projeto histórico da Universidade: a defesa da democracia, da autonomia e as estratégias de lutas” destacando a contradição entre a Lei 9192/1995, que institui a nomeação de reitoras e reitores por meio da lista tríplice, e a vigência da Constituição Federal de 1988, a qual instituiu a autonomia universitária.

“A existência dessa legislação é extremamente conveniente para o projeto neoliberal que tem a universidade como alvo da precarização, terceirização e privatização. A universidade possui muitas virtudes que foram constituídas com a participação do movimento docente e que o projeto neoliberal quer acabar”, contextualizou a docente.  “Precisamos revogar o entulho autoritário e não podemos esperar que os governos tomem a iniciativa. Em março de 2003, no início do governo Lula, o Ministério da Educação já formulara um projeto de lei que revogava a lista tríplice. Entretanto, esse projeto jamais foi encaminhado ao Congresso Nacional”.

A campanha nacional empreendida pelo ANDES-SN também tem como bandeiras a revogação da Lei 9192/1995 e do Decreto 1916/96 e mudanças na legislação, garantindo que a escolha da universidade prevaleça em respeito à autonomia universitária. “É fundamental que a gente, enquanto Sindicato Nacional e articulado a outras entidades, promova essa mudança. E, além disso, temos que ver que iniciativas do ponto de vista das normativas e decisões internas das universidades, podemos tomar”, afirma Vicente Ribeiro, que representou a Sinduffs – Seção Sindical do ANDES-SN na UFFS (Universidade Federal da Fronteira Sul), onde o  Conselho Universitário (Consuni) também deliberou pela destituição do reitor interventor, em outubro de 2019.

 

Protesto
Na tarde desta quinta (5), os e as docentes participantes do Encontro se uniram às demais categorias de servidores e servidoras, na Esplanada dos Ministérios, para um ato em defesa da Educação Pública, pela recomposição imediata dos salários dos SPF e pelo Fora Bolsonaro. As e os manifestantes se concentraram em frente ao Espaço do Servidor, no bloco C, e seguiram em marcha até a Praça dos Três Poderes.

Confira aqui os debates do Encontro.

 

Fotos: Lázaro Mendes e André Luís | imprensa ANDES | Imprensa ANDES-SN