Com 59 votos favoráveis, 7 contrários e 5 abstenções, o Conselho Universitário (Consun) da UFRGS deliberou, na sexta-feira (13), pelo encaminhamento do pedido de destituição do Reitor interventor, Carlos Bulhões, e da Vice-Reitora interventora, Patrícia Pranke, ao Ministério da Educação (MEC). A decisão foi tomada em cumprimento à Resolução 149/2021, originada a partir do Parecer 80/2021, elaborado pela comissão paritária que analisou as condutas arbitrárias da gestão, em especial, o descumprimento da Resolução 62/2021, a qual desaprovou as mudanças efetivadas pela reitoria interventora sem diálogo com a comunidade e em desrespeito ao Regimento e Estatuto da Universidade.
A decisão do Consun é mais um passo para o fim da intervenção na UFRGS e demonstra a posição da comunidade universitária de oposição à intervenção e de rejeição das ações que os interventores adotaram desde o início de seu mandato: a reestruturação administrativa feita à revelia do Conselho e a sua consequente desobediência à Resolução 62/2021; a falta de diálogo com o órgão máximo da UFRGS; e a incompetência administrativa que já levou à desestruturação da SEAD e da Relinter. Na prática, fica evidente que Bulhões, ocupante ilegítimo do cargo de reitor, não tem mais condições de administrar a UFRGS.
O professor Jorge Quillfeldt, representante docente no Consun, avalia que a votação foi um passo importante de resgate da autonomia universitária. “Antes da sessão do Consun, quase todas as Unidades da UFRGS realizaram reuniões, sendo que 20 das 29 votaram pela destituição. Ou seja, as bases falaram, e os diretores não estavam descolados. A maioria teve que votar de acordo com a sua base”, especifica.
O efetivo afastamento é atribuição do Ministro da Educação. De acordo com a legislação vigente, no caso dos cargos de reitor(a) e vice-reitor(a) estarem vagos, e na impossibilidade de imediato provimento, os cargos serão ocupados por reitor(a) e vice-reitor(a) pro-tempore indicados pelo Presidente da República. No prazo de 60 dias, uma nova lista tríplice deve ser elaborada e encaminhada ao Ministério da Educação, sendo de 4 anos o mando dos(as) novos(as) nomeados(as).
“Foi dado um recado potente porque, pela primeira vez, se reagiu a uma intervenção institucionalmente a partir do Consun”, aponta Quillfeldt, reforçando que o processo foi uma “resposta inesperada de uma universidade que é bastante conservadora nas bases”.
“Isso nos dá um pouco de luz no fim do túnel. Talvez já seja possível aferir um cansaço significativo da população, que pode ajudar a pressionar por uma mudança em nível nacional”.
Histórico de arbitrariedades
A gestão interventora, que ficou em último lugar na lista tríplice encaminhada ao MEC após o processo de eleição interno, foi empossada em setembro de 2020. No dia seguinte, deu início a uma série de mudanças estruturais introduzidas de forma autoritária e sem embasamento ou aval do Conselho, que tentou diversas vezes estabelecer o diálogo com a Administração Central.
“O que aconteceu na sessão foi o desenlace de um longo processo, somando onze meses de tentativas de encaminhar o problema causado pela reforma, feita rapidamente, sem consulta nem detalhamento por parte da Reitoria”.
Segundo Quillfeldt, a deliberação do Consun não se deve à nomeação intervencionista, e sim aos descumprimentos, por parte da Reitoria, de determinações impostas pelo Conselho na intenção de se fazer cumprir o regimento e o estatuto da Universidade, “mas foram solenemente ignoradas pelo Reitor, situação que se arrastou por meses a fio”.
Entre elas, o professor destaca a fusão de Pró-Reitorias e a criação da PROIR (Pró-Reitoria de Inovação e Relações Institucionais), “puxando o que já estava numa secretaria bem articulada, e que inclusive está assumindo papeis bem mais amplos do que o nome diz, quase que propondo um novo pilar dentro da universidade”.
O docente cita, ainda, que outras transformações afetaram o bom funcionamento da SEAD (Secretaria de Educação a Distância), “o que é muito preocupante no meio do Ensino Remoto Emergencial”, e a desarticulação da Relinter.
“É compromisso de cada integrante do Consun fazer cumprir o estatuto da universidade. Estamos apenas cumprindo o que se espera que cumpramos”, explica.
O decano do Consun, professor Celso Chaves, justificou sua abstenção. Como será ele a assinar a documentação a ser enviada ao MEC, entende que, ao se abster, protege o processo de possíveis questionamentos. Já o conselheiro representante docente Eduardo Rolim, que também é diretor do Sindicato Municipal dos Professores de Instituições Federais de Ensino Superior do Rio Grande Do Sul (Adufrgs), votou contrariamente à destituição dos interventores, e não mencionou consulta à base para sustentar sua posição.
Outros encaminhamentos
Além da votação pela destituição, outras medidas já aprovadas pelo Conselho Universitário ainda serão tomadas: encaminhamento ao Ministério Público Federal de documento apontando indícios de violação dos princípios da legalidade e publicidade (Art. 4 da Lei 8.429/92) – que podem caracterizar, inclusive, prejuízo ao patrimônio público, e a solicitação de instauração de Processo Administrativo Disciplinar (PAD) no Ministro da Educação (MEC) contra Bulhões. Embora algumas ações da Resolução 149/2021 se voltem exclusivamente ao reitor interventor, o Estatuto da UFRGS atribui ao Conselho Universitário a proposição de destituição “do reitor e do vice-reitor”, de modo que a atual vice-reitora interventora, professora Patrícia Pranke, também é atingida pela decisão do Consun a respeito de encaminhar pedido de destituição da reitoria interventora.
O ANDES/UFRGS, que desde a nomeação vem se posicionando e lutando contra o autoritarismo da Reitoria interventora e pelo afastamento, comemora esta importante decisão para a manutenção da democracia e da autonomia universitária.