Em meio a mais de 245 mil mortes confirmadas pelo novo coronavírus no Brasil, um grupo de professores e servidores da Faculdade de Direito da UFRGS divulgou, no domingo (21), carta aberta denunciando a responsabilidade do governo federal pelo agravamento da pandemia no país e defendendo a abertura de procedimento de impeachment de Jair Bolsonaro pelo Congresso Nacional. O documento pode ser assinado por colegas de outras unidades da Universidade, na ativa ou aposentados, clicando aqui.
“É verdade que a pandemia já encontrou um Brasil esfacelado por medidas adotadas em governos anteriores, como o congelamento de investimentos sociais, por força da Emenda Constitucional nº 95/2016, que levaram a uma redução drástica dos recursos públicos destinados ao Sistema Único de Saúde (SUS). Mesmo assim, impressionam as ações praticadas pelo Sr. Presidente fragilizando ainda mais o SUS em plena pandemia, a exemplo das sucessivas trocas no comando do Ministério da Saúde, que culminaram na nomeação de um General do Exército e de outros oficiais das Forças Armadas, servidores militares atuando fora das suas funções de carreira, completamente inaptos para o exercício de atribuições no serviço público em uma área tão complexa como a da saúde”, diz o texto.
“A assombrosa campanha de minimização da gravidade da pandemia deflagrada com a conivência presidencial não apenas fragiliza ainda mais o dedicado trabalho dos profissionais que atuam no SUS, como também confunde a população, contribuindo decisivamente para a disseminação da doença”, alertam os autores, acrescentando que a atuação pessoal do Presidente da República, no auge de uma crise sanitária, ultrapassa limites éticos, jurídicos e humanitários, “seja pelo incentivo à realização de aglomerações e ao abandono da utilização das máscaras, seja pela recomendação de medicamentos sem comprovada eficácia na prevenção ou tratamento da Covid-19, na contramão das orientações da comunidade científica e da Organização Mundial da Saúde (OMS)”.
Diante desse cenário, os signatários defendem que as condutas perpetradas por Bolsonaro devem ser, com urgência, devidamente apuradas e julgadas. “Como juristas, precisamos nos manifestar e dizer que, para além de questões políticas ou pontuais de conjuntura, o que importa é a construção de um país que caminhe em direção ao que garante a Constituição, enquanto o que observamos hoje no Brasil é uma falta de política efetiva de garantia de direitos humanos, à saúde e à vida”, analisa a professora Ana Paula Motta Costa, Vice-diretora da Faculdade de Direito e uma das articuladoras do documento.
Não há mais tempo para omissão
Nas últimas 24 horas, o Brasil registou 554 mortes pela doença, somando 246.560 vidas perdidas em função da Covid-19. Já são 32 dias com média móvel de óbitos acima de 1 mil, e 11 estados estão com alta nas mortes – entre eles o Rio Grande do Sul, que já chega a mais de 11,7 mil mortos e, na última sexta-feira (19), teve mais da metade de seu território classificado em bandeira preta pelo mapa de distanciamento controlado, significando risco altíssimo de contágio.
“O dever cívico nos convoca a fazer o registro histórico de que sabemos que o nível de adoecimento e mortalidade no Brasil, por complicações decorrentes da Covid-19 e causas colaterais, bem como o aprofundamento do desemprego, do desamparo e da miséria, constituem circunstâncias que decorrem de escolhas políticas que traduzem um deliberado descumprimento de deveres constitucionais”, diz a carta aberta.
“Na falta de uma política, há uma política”, pontua a professora Ana Paula, frisando que um governo que se omite neste momento não apenas está violando os direitos da população, como direcionando essas pessoas para a morte. “Está na hora de propor um impeachment pela violação aos direitos humanos e pela promoção de genocídio na sociedade brasileira”.