Em Assembleia Geral realizada virtualmente nesta quarta-feira (3), as e os docentes da UFRGS aprovaram apoio ao indicativo de à greve sanitária caso haja a imposição do retorno ao trabalho presencial antes da vacinação em massa para o novo coronavírus. Diferente de uma greve tradicional, em que as atividades regulares são substituídas por uma agenda de mobilização e reivindicações, na greve sanitária as atividades de ensino continuam sendo realizadas remotamente.
O indicativo de greve sanitária é uma mobilização política da categoria, articulada pelo ANDES-SN, para fazer frente à pressão do MEC pelo retorno presencial por meio da Portaria nº 1.038, de 07 de dezembro de 2020, que prevê recomeçar as aulas in loco em 1º de março de 2021. Em resposta a essa insistência antes do controle da pandemia, a possível paralisação foi definida em conjunto pelos setores das Instituições Federais de Ensino (IFEs) e Instituições Estaduais e Municipais de Ensino (IEEs/IMEs), baseada em decisão do 9º Conad Extraordinário do ANDES-SN.
Na UFRGS e na maioria das universidades federais, não há previsão de retorno presencial em março. Essa situação está contemplada na própria Portaria, quando aceita a manutenção do trabalho remoto em caso de “condições sanitárias locais que tragam riscos à segurança das atividades letivas presenciais”. Todavia, o governo Leite pressiona para o retorno, conforme notícia veiculada na Zero Hora de quarta-feira (3). Além disso, alguns reitores, sobretudo interventores, poderão pressionar para o retorno presencial, em sintonia com o MEC.
A decisão da Assembleia Docente é um alerta de que as e os docentes da UFRGS não estão dispostos a retornar às salas de aula sem que haja vacinação massiva da população; e também uma disposição de solidariedade com aqueles e aquelas colegas de outras universidades que porventura sejam pressionados ao retorno presencial.
O tema será discutido em reunião do Setor das IFES do ANDES-SN, neste sábado (6). Caso ocorra determinação de retorno e a greve seja deflagrada, deverá haver nova Assembleia local para decidir sobre a adesão à greve.
Outros encaminhamentos da Assembleia
Além da adesão ao indicativo de greve sanitária, a Assembleia também discutiu sobre o trabalho docente no ensino remoto emergencial (ERE) e sobre a reestruturação administrativa realizada pela Reitoria interventora.
Na próxima reunião conjunta dos setores das federais e estaduais e municipais do Sindicato Nacional, a ser realizada no próximo sábado (6), o ANDES/UFRGS apresentará o encaminhamento de que o ANDES-SN reivindique o ressarcimento dos gastos que as e os docentes têm efetivado para realizar as atividades do ERE. Na discussão local, colegas relataram que tiveram que comprar equipamentos e periféricos e aumentar velocidade de internet, sem o que não seria possível praticar um ensino minimamente adequado ao contexto atual. A orientação da Assessoria Jurídica da Seção Sindical é que os docentes guardem todos os comprovante de despesas referentes ao ERE para consubstanciar requerimentos de ressarcimento. A Administração Central da UFRGS ainda não apresentou as contas sobre a redução dos gastos de custeio – energia elétrica, restaurantes universitários, dentre outras despesas – desde o início da pandemia e de que como esses recursos serão aplicados.
Sobre a reestruturação administrativa, foi apresentada uma retomada do histórico da intervenção na UFRGS, que já completa 5 meses e foram indicados os movimentos da Reitoria interventora para sua naturalização. A reestruturação, implantada em outubro, logo no início do mandato, ainda não foi aprovada pelo Consun, que enfrenta manobras, atrasos e arbitrariedades do Reitor interventor. Foi discutido que é importante que as e os docentes estejam inteirados do assunto e apoiem os conselheiros na discussão do assunto.
Sobre as plataformas do Ensino Remoto, foi mencionada a importância de ampliar e fortalecer softwares livres como o MConf, produzidas colaborativamente e, portanto, mais estáveis e seguras, todas características consistentes comas funções de uma Universidade Pública. O tema deverá ser tratado nas próximas audiências do ANDES/UFRGS com a Administração Central.
Ainda durante a Assembleia, foi aprovada moção de solidariedade ao professor do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) Marcus Vinicius de Freitas Rosa, que ministrou a aula pública “Branquitude: novas perspectivas sobre relações raciais”, e contra manifestações racistas em redes sociais.
Em defesa da vida
A deliberação sobre a greve sanitária está sendo tomada nas seções sindicais do ANDES-SN. As decisões serão apresentadas em reunião do Sindicato Nacional neste sábado (6).
Na UFSM, a categoria também aprovou a construção de um movimento grevista por motivos sanitários, em assembleia da Sedufsm realizada na semana passada. “Qualquer retomada presencial sem a garantia da segurança sanitária da comunidade acadêmica é irresponsável. É uma greve diferente do que ocorre tradicionalmente, por questões trabalhistas. É uma greve por segurança sanitária. A UFSM é um município dentro de um município. São quase 30 mil pessoas que circulam diariamente no campus”, avalia a presidente da Seção Sindical do ANDES-SN na UFSM, Laura Regina Fonseca.
O mesmo aconteceu em assembleia geral online realizada pelo SindoIF. “Nosso sindicato só irá admitir o retorno presencial após a imunização da comunidade escolar em níveis cientificamente aceitáveis, garantindo a segurança sanitária de docentes, técnico-administrativos, terceirizados, estudantes e de seus familiares. Queremos muito voltar ao ensino presencial porque entendemos que esta é a modalidade que melhor garante uma educação de qualidade, inclusiva e socialmente referenciada – como sempre defendeu nosso Sindicato Nacional em seus 40 anos de história. Mas não podemos e nem devemos voltar sem segurança sanitária”, esclarece o site da entidade.
Professores e professoras das redes estadual e municipal do Rio de Janeiro também decretaram greve sanitária no último final de semana.
Em São Paulo, a rede estadual realiza assembleia online na próxima sexta-feira (5) para deliberar sobre o tema, e no Paraná, assembleia da rede estadual aprovou greve geral a partir de 18 de fevereiro. “Em vez de pressionar ou atuar por um plano nacional de vacinação para, então, pensar na retomada das atividades de ensino, pesquisa e extensão, o governo cede à pressão do setor privado, libera a volta delas e joga o ônus nas costas do funcionalismo e estudantes”, diz nota do Sindiprol/Aduel.
ANDES-SN defende mobilização por vacinação em massa
No mesmo dia em que docentes da UFRGS decidiam pela greve sanitária, o Sindicato Nacional divulgou nota defendendo a pressão pela vacinação em massa. “A alternativa à falta de planejamento do governo federal, ao invés de antecipar vacinação à(o)s docentes, deve ser a de lutar para que somente com vacinação para todas e todos poderemos cogitar o retorno presencial às aulas. A antecipação da vacinação só estaria servindo para atender especialmente às pressões do setor privado da educação e aos governos que querem o retorno às aulas presenciais em prejuízo da vida. Isto aglomeraria e tornaria ainda mais exponencial, pela natureza do trabalho escolar, a contaminação do(a)s demais trabalhadore(a)s que não estão inserido(a)s nas prioridades”, esclarece texto do ANDES-SN, enfatizando que essa posição é política, “mas, acima de tudo científica”.
“É necessário que se considere que a maior parte da população que acessa a educação pública, utiliza-se de transporte coletivo público, o que em si já representa um risco de contaminação”, exemplifica a entidade, acrescentando que o retorno presencial exigiria uma estruturação das instituições de ensino e do transporte público, para o qual o país não se preparou. “Isso ficou evidente, por exemplo, na aplicação das provas do ENEM, realizadas em instituições de ensino que em sua maioria não estavam preparadas e não tinham estrutura sanitária”.
Direito legítimo
A greve sanitária é um direito legítimo de todos os trabalhadores (inclusive em estágio probatório), que tem como base legal a convenção 155 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil em 29 de setembro de 1994.
Ampara-se na ausência de condições adequadas para afastar riscos graves e iminentes de exposição no ambiente de trabalho e no deslocamento, destacados em orientações de órgãos e entidades de saúde.