Consun volta a discutir reestruturação da UFRGS, imposta pela Reitoria interventora, nesta sexta (5)

 

A reestruturação da UFRGS, implementada arbitrariamente pela Reitoria interventora em 2020, voltará à pauta do Conselho Universitário (Consun) nesta sexta-feira (5). As discussões, iniciadas em setembro do ano passado, têm ocorrido de maneira truncada e lenta, dificultando a apreciação da proposta e a manutenção da democracia na instituição.

As modificações estratégicas na estrutura organizacional começaram já no primeiro dia do mandato interventor, sem qualquer diálogo com a comunidade acadêmica. Graças a um requerimento com mais de 50 assinaturas de conselheiros, o órgão máximo deliberativo da Universidade pôde colocar o assunto em pauta em uma sessão extraordinária autoconvocada, iniciada no dia 5 de outubro.

Desde então, o assunto é tratado com superficialidade pelo Reitor interventor Carlos Bulhões, que inclusive encerrou abruptamente a reunião virtual, sem justificativa regimental nem votação das pautas propostas pelos conselheiros. Na ocasião, a medida foi repudiada por unanimidade entre os participantes, que também concordaram com a ilegalidade da reforma em andamento.

“Esse processo já iniciou de forma equivocada. É importante ressaltar que não houve um momento no qual a nova administração central apresentasse ao Conselho Universitário um projeto de Reforma Administrativa. O Consun, assim como toda a comunidade universitária, soube das reformas como fato consumado”, denuncia a professora do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) Natalia Pietra Méndez, representante docente.

Dada a ausência de diálogo por parte da Reitoria, uma Comissão Especial foi constituída para analisar o projeto – parecer entregue em dezembro, quando ocorreram dois pedidos de vistas, que retiram a matéria da pauta.

“O documento que a Administração encaminhou para, supostamente, explicitar os objetivos da reforma é superficial e não apresenta dados consistentes sobre os impactos das mudanças que foram impostas para a universidade. A Comissão Especial, criada para examinar o tema e elaborar um parecer, fez um trabalho excelente, ouvindo diversos setores afetados pela reforma e constatando que a mesma não aporta melhorias para a gestão”, opina Natalia.

Em janeiro, o tema não foi retomado em função de prazos regimentais e, em fevereiro, não houve convocação. “Tudo isso motivou alguns conselheiros e conselheiras a enviarem carta à comunidade universitária, relatando a morosidade da Administração Central em levar o tema para o debate e exigindo a convocação do Conselho Universitário”, relata a professora, para quem a conduta evidencia a “tentativa equivocada de implementar uma reforma de cima para baixo, bem como uma falta de reconhecimento ao trabalho de conselheiros e conselheiras”.

Manobras regimentais

Apesar do rápido trabalho da Comissão Especial, que apresentou seu parecer em dezembro, nunca houve convocação específica para que o Conselho pudesse, de fato, se dedicar à matéria. “Não acredito que a discussão vá se esgotar nesta sessão porque a pauta é longa, envolvendo outras questões. Possivelmente, o debate seja suspenso na metade, para ser retomado no dia 12, quando se completam seis meses da nova gestão”, prevê o representante docente Pedro Costa, professor da Escola de Administração e presidente da Comissão.

“Espero que o assunto seja efetivamente discutido nesta semana, o que já vem tardando. Não tivemos reunião em fevereiro, e acho que, no mínimo, uma reunião mensal é importante, ainda mais neste contexto de crise política, pandemia e corte de verbas, quando deveríamos estar quase que permanentemente reunidos. Mas a nova Administração acabou se fechando num grupo muito pequeno, que quer impor essas medidas à universidade sem escutá-la”, acrescenta o professor Benito Schmidt (IFCH), também representante docente no órgão.

Ideologia

Entre as mudanças realizadas pela gestão interventora estão a junção de Pró-Reitorias de Graduação e Pós-Graduação e a dissolução da Coordenadoria de Acompanhamento do Programa de Ações Afirmativas (CAF), criada pelo próprio Consun.

“O centro da reforma administrativa é o entendimento de que a Universidade precisa adotar modelos gerenciais inspirados na iniciativa privada, investindo na sua relação com interesses do mercado, colocando em segundo plano sua vocação para fomentar a produção de conhecimentos e recursos humanos que visem o interesse público e social”, lamenta a professora Natalia.

“Quando se fala em Pró-Reitoria de Inovação, o que quer dizer a inovação? A quais setores sociais queremos que essa inovação se dirija? Esse é um ponto importante de debate que não pode simplesmente se fechar em uma proposta de reforma”, questiona o professor Benito. “A discussão precede as mudanças administrativas, e é isso que tem que ficar claro para a nova reitoria”.

Democracia

“Como uma universidade do porte da nossa passa um mês sem reunir seu principal órgão deliberativo? De fato, há algo de estranho nos procedimentos da atual Administração”, pondera a professora Natalia, frisando que, desde o ano passado, a UFRGS vive “uma política de intervenção que está jogando esforços pesados para mudar o perfil da Universidade sem debater estas mudanças com a comunidade e com os conselhos”.

“Precisamos preservar e aprofundar o caráter democrático, o que implica diálogo permanente da Administração com o Consun. Esse diálogo nem sempre é fácil, em alguns momentos é preciso modificar ideias, mas é isso que faz a democracia, ainda mais em uma universidade de ponta como a UFRGS”, enfatiza Schmidt, lembrando que a instituição já passou por outros processos de mudanças, todos arduamente tratados junto ao Consun e à comunidade.

“Não sou contra mudanças na Administração Central, mas elas devem derivar de amplo processo de escuta, do qual podemos ver emergir sugestões e outras experiências. Grave não é a reforma em si, mas a forma como foi feita”, analisa o docente, salientando desejar que Bulhões “se sensibilize com esse clamor da comunidade e não tente fazer essas reformas por cima, cooptando diretores para obter votos no Consun”.

Acompanhe a sessão do Consun pelo canal https://aovivo.ufrgs.br/consun/ , nesta sexta-feira (5), a partir das 8h30min.