Comunidade escolar de Porto Alegre realiza ato contra novo currículo em 15 de outubro

15 de outubro, Dia das Professoras e dos Professores, será de mobilização contra a nova proposta curricular para o Ensino Fundamental de Porto Alegre. Trabalhadoras e trabalhadores da Educação municipal realizarão ato às 16h, em frente à Secretaria da Educação da capital (SMED), para repudiar a conduta autoritária da Prefeitura e reivindicar a realização de um Congresso da Rede Municipal de Ensino.

A SMED alega que o novo currículo, apresentado em 23 de julho, seria uma adaptação à Base Nacional Comum Curricular (BNCC), aprovada em 2018, mas ainda não implementada pela Prefeitura.

A proposta, que deverá valer a partir de 2022, prevê aumento da carga horária de Português e Matemática, diminuição dos períodos de Geografia e História, maior oferta de Ensino Religioso e supressão das aulas de Filosofia.

Simulando processo participativo, a SMED propõe que os professores escolham, em votação via formulário, um dentre dois cenários propostos, com pequenas diferenças na distribuição das cargas horárias, ambos excluindo a disciplina de Filosofia. O simulacro de votação, que teria início na segunda-feira (4), foi adiado; a previsão da SMED é de que seja retomado no dia 15. Após essa consulta, o projeto de alteração curricular deve ser enviado ao Conselho Municipal de Educação.

Mobilização

As mudanças não foram discutidas com a comunidade escolar, que solicita a suspensão do cronograma e a convocação do Conselho Municipal de Educação para reiniciar a discussão.

Em manifesto público, a Associação dos Trabalhadores em Educação do Município de Porto Alegre (Atempa), o Simpa (Sindicato dos Municipários de Porto Alegre) e de outros 11 grupos ligados a professores, orientadores, supervisores e pais denunciam inconsistências legais na proposta.

O documento afirma, ainda, que “não foi apresentado nenhum documento formal que explicite o marco conceitual, referências legais, fundamentos teóricos, diagnóstico situacional, explicitação da metodologia e transparência sobre processo decisório”, denunciando “uma flagrante e incontestável negação do conceito e do princípio da Gestão Democrática”.

A Associação, que organiza uma campanha para publicizar o autoritarismo da Smed, também fez denúncia formal para a Promotoria Regional da Educação contra o projeto.

Entenda

Além da exigência normativa de adequação à BNCC, o ensino municipal de Porto Alegre é regido por uma série de regulamentações nacionais, estaduais e municipais, como a lei 8.198, de 1998, que criou o Sistema Municipal de Ensino de Porto Alegre, e a Lei de diretrizes e bases da educação nacional. No entanto, o documento que influencia de forma mais abrangente questões como a base curricular é o Caderno Pedagógico nº 9, lançado pela Prefeitura em 1997 como parte da implementação dos Ciclos de Formação da Escola Cidadã, projeto estrutural que dividiu o ensino em três ciclos e é a base da Rede Municipal até hoje.

Pela BNCC, que determinou o Ensino Religioso como uma das áreas do conhecimento, um período semanal da matéria passaria a constar em todos os anos do ensino municipal – porém, seguindo a lei estadual, a matéria tem adesão facultativa – ou seja, o aluno pode optar por participar de um projeto temático no lugar do Ensino Religioso, sendo que um professor específico da área deve constar na equipe das escolas.

“Como muitas comunidades não demandam pelo Ensino Religioso, são feitos projetos de leitura e oficinas, entre outros. O que parece estar sendo introduzida é a propaganda da oferta do Ensino Religioso em detrimento da Filosofia”, avalia Ezequiel Viapiana, diretor da Atempa, mencionado em reportagem do Matinal Jornalismo.

Outro ponto criticado está no momento escolhido para as alterações.

“Um processo de reestruturação de currículo não deveria ser feito no meio de uma pandemia. Necessário agora é ter merenda para todo mundo. O que mais recebo é reclamação de famílias no ensino remoto sem cesta básica”, acrescenta o professor.

Pressões internacionais

“A prioridade que a SMED quer atribuir à Língua Portuguesa e à Matemática está em sintonia com as pressões exercidas por instituições como o Banco Mundial e a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) no sentido de uma educação escolar centrada nas habilidades requeridas por empregos de baixa qualidade”, afirma a professora Elisabete Búrigo, da diretoria do ANDES/UFRGS. Avaliações comparativas em larga escala, como o Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa) e a Prova Brasil, estão centradas nessas duas disciplinas. O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), criado em 2007 como instrumento regulador de várias políticas educacionais, está baseado nos resultados dessas provas, que não são auditadas – nem mesmo os itens de provas são divulgados, com o pretexto da comparabilidade entre exames aplicados ao longo do tempo. Desse modo, redes e escolas são pressionados a ampliar a carga horária dessas disciplinas, e professores e estudantes são pressionados para moldar o currículo segundo as provas.

Solidariedade

O ANDES/UFRGS é solidário com as trabalhadoras e os trabalhadores da educação municipal de Porto Alegre e convida as e os docentes da UFRGS a participarem da mobilização na sexta-feira (15), às 16 horas, em frente à SMED (Rua dos Andradas, 680, Centro Histórico, Porto Alegre, RS).