Compra de vacinas por empresas é imoral e inconstitucional, avalia o ANDES-SN

 

A Câmara dos Deputados concluiu, em 7 de março,  a votação do Projeto de Lei 948/2021, que permite à iniciativa privada comprar vacinas contra a Covid-19, furando a fila do Plano Nacional de Vacinação, para a imunização de funcionários. Para o ANDES-SN, além de imoral e inconstitucional, a proposta enfraquece a Anvisa e o Plano Nacional de Imunização.

“É inaceitável”, frisa Rivânia Moura, presidenta do ANDES-SN, explicando que a medida tira do governo federal a responsabilidade constitucional de garantir e providenciar, por meio do SUS, a imunização de toda a população. “Isso não foi feito até o momento porque o governo não providenciou a compra das vacinas em tempo hábil. O SUS tem condições de imunizar milhões de pessoas por dia”, denuncia.

De acordo com o texto aprovado, além de poder comprar vacinas contra a Covid-19 que tenham registro sanitário definitivo concedido pela Anvisa, empresas e associações poderão adquirir imunizantes com autorização temporária para uso emergencial ou autorização excepcional e temporária para importação e distribuição.

Ataque frontal à Anvisa

O PL 948/21 permite também que empresas e associações driblem a autoridade da Anvisa e adquiram imunizantes sem registro ou autorização da agência, desde que tenham aval de qualquer autoridade sanitária estrangeira reconhecida e certificada pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

Mesmo que estabeleça que as empresas deverão doar 50% das doses adquiridas para o Sistema Único de Saúde, isso não poderá ser feito no caso da aquisição de imunizantes que ainda não tenham sido aprovados pela Anvisa – ou seja, dificilmente vão contribuir ou acelerar a campanha de vacinação contra Covid-19 no Brasil.

A presidenta do ANDES-SN ressalta ainda que a Constituição Federal prevê que é atribuição única e exclusiva do Sistema de Saúde brasileiro atestar a segurança e qualidade de medicamentos. Ela lembra os mais de 14 milhões de brasileiros e brasileiras sem emprego e a grande parcela da população em trabalhos informais, que ficarão completamente desassistidos, uma vez que a proposta, se aprovada, deverá ampliar o descaso do governo federal com a imunização de brasileiras e brasileiros.

“É revoltante o que tem sido feito com a imunização nesse país. Até hoje, só 2,8% da população tomou as duas doses da vacina. É inadmissível um projeto desse teor, que, de fato, vai aprofundar gravemente o processo de desigualdade social, já agravado pela pandemia”, lamenta a docente, prevendo que o projeto impacte diretamente a população mais pobre, que mais precisa do SUS.

Quem poderá comprar e vacinar?
Conforme o texto aprovado pelas deputadas e deputados, as regras se aplicam às pessoas jurídicas de direito privado, individualmente ou em consórcio.

Poderão ser vacinados ainda outros trabalhadores que prestem serviços a elas, inclusive estagiários, autônomos e empregados de empresas de trabalho temporário ou de terceirizadas.

Quanto às pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos (associações ou sindicatos, por exemplo), a permissão vale para seus associados ou cooperados.

A proposta permite que as empresas escolham entre doar integralmente as doses adquiridas para o SUS, o que já estabelece a legislação em vigor, ou aplicar as doses exclusivamente nos seus trabalhadores, de forma gratuita, e doar a mesma quantidade utilizada ao Programa Nacional de Imunização. No entanto, se a empresa adquirir vacinas que não tenham aprovação da Anvisa, as mesas não poderão ser usadas no PNI. Além disso, parcela da população será imunizada com medicamento ainda não aprovado pelo órgão regulador do Sistema de Saúde brasileiro.

“Vacinação é política pública e precisa ser feita pelo nosso Sistema Único de Saúde. Esse projeto para compra de vacinas por empresas é imoral, é inconstitucional e é revoltante. Não podemos aceitar! Vamos continuar com a campanha nacional pela vacinação pública e gratuita para todas e todos, pelo SUS”, afirma a presidenta do ANDES-SN.

Vacinas privadas no mundo
O Brasil é um dos poucos países no mundo onde se discute a possibilidade de vacinação contra a Covid-19 pelo setor privado. Na América Latina, apenas o México aprovou tal medida. A vacina também pode ser comprada por empresas no Paquistão, Tailândia, Filipinas e Malásia. Nem mesmo nos Estados Unidos, onde o Sistema de Saúde não é público nem gratuito, se permitiu, até o momento, a vacinação da população pela iniciativa privada.

Tramitação
O texto aprovado pela Câmara foi o relatório elaborado pela deputada Celina Leão (PP-DF), ao Projeto de Lei 948/21, do deputado Hildo Rocha (MDB-MA). A proposta segue para votação no Senado, ainda sem previsão de apreciação. Se aprovada, vai à sanção presidencial.