Comitê de Combate à Megamineração lança dossiê de especialistas contra a Mina Guaíba

 

O Comitê de Combate à Megamineração no Rio Grande do Sul (CCMRS), coletivo que congrega mais de 120 entidades – entre elas, o ANDES/UFRGS –, lançou nesta terça-feira (10), no auditório da Faculdade de Economia da UFRGS, o primeiro volume do dossiê Painel de Especialistas – Análise Crítica do Estudo de Impacto Ambiental da Mina Guaíba. A publicação reúne estudos de 37 pesquisadores de diversas instituições de ensino e pesquisa do Estado, de áreas como Biologia, Saúde, Economia, Geologia, Sociologia, entre outras, contrapondo com dados científicos diversos pontos do Estudo de Impacto Ambiental e do Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) apresentados pela empresa Copelmi, responsável pelo projeto. A publicação foi viabilizada pelo apoio financeiro de sete entidades, sendo uma delas a Regional Rio Grande do Sul do ANDES-SN.

Se aprovada, a mina será a maior lavra de carvão a céu aberto do Brasil, ocupando uma área total de cerca de 5 mil hectares entre os municípios de Charqueadas e Eldorado do Sul, e extraindo mais de 160 milhões de toneladas de carvão mineral (além de areia e cascalho), em 23 anos de operação.

A iniciativa gaúcha teve como inspiração o documento “Painel de Especialistas: Análise Crítica do Estudo de Impacto Ambiental do Aproveitamento Hidrelétrico de Belo Monte”, lançado em 2009 em alerta sobre os sérios impactos da usina hidrelétrica, inaugurada em 2016 em Altamira (Pará), contra a vontade da população – que desalojou milhares de pessoas e continua afetando seriamente o rio Xingu e toda biodiversidade local.

“O propósito é qualificar o debate público, o processo de licenciamento ambiental e ações de cunho jurídico, a partir de informações técnicas independentes”, explica o documento, de mais de 200 páginas.

A publicação aborda cinco grandes componentes do projeto: Meio Físico (análises de recursos hídricos, solo, qualidade do ar e alterações paisagísticas); Meio Biótico (questões relacionadas a flora e fauna nativas, inclusive ameaçadas de extinção, assim como à Área de Proteção Ambiental, ao Parque Estadual Delta do Jacuí e à recuperação da área degradada após a exaustão da jazida); Meio Socioeconômico (apresentando as falhas na caracterização socioeconômica, as inconsistências do Plano de Reassentamento Involuntário das populações residentes na área e os contrapontos ao discurso do desenvolvimento pela mineração); Populações Indígenas (expondo a complexidade da sociedade Guarani e a invisibilidade das aldeias indígenas do entorno nos estudos pela negação do direito à consulta livre, prévia e informada) e Saúde (explicitando a completa falta de avaliação dos efeitos nocivos à saúde oriundos deste projeto carbonífero).

Inviabilidade socioambiental

Caso o projeto da Mina Guaíba seja aprovado pela Fepam, 72 famílias de agricultores do assentamento Apolônio de Carvalho, segunda maior unidade produtora de arroz orgânico do Estado depois de Viamão, precisarão deixar suas terras. Além disso, cerca de 80 famílias do Loteamento Guaíba City, de Charqueadas, também serão desalojadas, e haverá impacto sobre comunidades indígenas guaranis e sobre aproximadamente 2 mil pescadores das ilhas que compõem o Delta do Jacuí, uma das mais importantes áreas de conservação do Rio Grande do Sul. Conforme EIA-Rima feito pela própria Copelmi, no sexto ano de operação do empreendimento, a concentração de poluentes poderia ultrapassar em até 241% o permitido pela legislação ambiental.

Além disso, os danos à qualidade do ar e da água, tanto para Guaíba quanto para Porto Alegre, Eldorado do Sul e Charqueadas, têm sido ressaltados pelas comunidades locais e pelo Comitê, que segue reivindicando audiência pública sobre o tema na capital, já que os impactos atingirão os porto-alegrenses. Até agora não houve aceno da Fundação neste sentido.

Os autores do dossiê relatam que muitos pareceres apontando para a inviabilidade socioambiental do projeto foram apresentados à Fundação no rito do processo de licenciamento ambiental, durante o período de consulta pública. Em consequência, em agosto de 2019, a entidade emitiu um ofício com cerca de 130 itens para serem complementados pela companhia, além de ter anexado mais de 20 pareceres que também necessitam de respostas.

“Para que a sociedade civil organizada tenha acesso às novas informações, tendo tempo hábil de analisar os novos documentos da empresa, e emitir novos pareceres que possam ser considerados pelo órgão licenciador, continuamos exigindo novas Audiências Públicas oficiais do processo de licenciamento ambiental, desta vez incluindo Porto Alegre (que é potencialmente afetada), após a apresentação das complementações pela empresa. Tal demanda justifica-se considerando a quantidade e complexidade das complementações solicitadas, configurando alterações significativas nas informações relacionadas ao projeto”, cita o documento.

O volume alerta ainda que o projeto da Mina Guaíba não é isolado, fazendo parte da política de fortalecimento de uma matriz energética baseada na queima de carvão mineral, com a pretensão de instalação de um Polo Carboquímico na região. “Projeto este que não foi nem está sendo discutido com a sociedade e que demandará, caso seja efetivado, após o carvão da Mina Guaíba ser exaurido (em pouco mais de 20 anos), a abertura de novas minas na região, indefinidamente”, previnem os pesquisadores.

Tal pretensão está totalmente na contramão da análise do Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres, durante a Cúpula do Clima de 2019, que reforçou estarmos “perdendo a batalha contra a mudança climática” e pediu o fim da construção de usinas de carvão a partir de 2020 em todo o mundo, além da anulação gradual dos subsídios aos combustíveis fósseis e uma mudança rápida para fontes de energias renováveis, como solar, eólica e geotérmica. “Consideramos que a falta de informações sobre o Polo Carboquímico é extremamente grave e que o projeto deveria estar sendo debatido e considerado no processo de licenciamento ambiental neste mesmo momento, em função da completa interdependência entre Polo e Mina, avaliando assim os impactos sinérgicos destes projetos”.

Para acessar a íntegra do Dossiê Painel de Especialistas, clique aqui.

Proposta para 39º Congresso do ANDES-SN

Em Assembleia Geral Docente realizada no dia 25 de novembro, convocada pelo ANDES/UFRGS, foi aprovado o encaminhamento de texto de resolução para o 39º Congresso do ANDES-SN, que ocorrerá em São Paulo, em fevereiro de 2020. O texto, que será apreciado no Congresso, foi redigido pelo professor Rafael Flores, da Escola de Administração, e estipula que: “O ANDES-SN continuará atuante na luta contra o avanço da mineração no Rio Grande do Sul, fortalecendo o Comitê de Combate à Megamineração no Rio Grande do Sul e buscando a unidade de todos que estão dispostos a construir a resistência à megamineração no estado; e incentivará a luta contra a mineração em outros estados.”