Com a triste marca de 200 mil mortes e crescente contaminação, vacina e ciência são essenciais no combate à pandemia no Brasil

Enquanto diversos países já estão aplicando vacinas contra o novo coronavírus, o Brasil ainda sofre com indefinições a respeito da imunização e partidariza decisões e medidas que deveriam estar amparadas em conclusões científicas.

Em todo o ano de 2020, o governo federal firmou apenas um acordo para produção de doses, ao mesmo tempo em que o presidente da República, Jair Bolsonaro, se consolidava como garoto propaganda do negacionismo frente ao agravo da pandemia.

A boa notícia vem da ciência: duas fórmulas desenvolvidas no Brasil – Instituto Butantan/ Sinovac e Fiocruz/Universidade de Oxford/AstraZeneca – já estão com pedido de uso emergencial junto à Anvisa, que deve se manifestar sobre as concessões em até dez dias. Cabe lembrar que tanto o Butantan quanto a Fiocruz são instituições públicas, cujos pesquisadores, servidores públicos,  conseguiram realizar testes e produzir as vacinas apesar da falta de investimentos dos governos federal e do estado de São Paulo em pesquisa.

Zombando do povo brasileiro, nesta segunda-feira (11), o militar especialista em logística que ocupa o Ministério da saúde, Eduardo Pazzuelo, afirmou que a vacinação no Brasil “irá começar no dia D, na hora H” e que terá apenas 1 dose.

Nesta terça-feira (12), deverá ser feito o último anúncio do Butantan sobre a eficácia geral da CoronaVac, que já apresentou resultados preliminares animadores. Na Indonésia, testes locais com a mesma fórmula apresentaram  65% de eficácia, ultrapassando a taxa mínima recomendada pela OMS, que é de 50%.

Ciência salva vidas

O desenvolvimento das vacinas contra a Covid-19 no mundo inteiro só foi possível graças a investimento em pesquisa e ciência – setor que, no Brasil, vem enfrentando sucateamento e descaso crescentes.

Uma das grandes conquistas foi a tecnologia inovadora de RNA, já aprovada nas fórmulas da Pfizer e da Moderna, que pode mudar para sempre a maneira de fabricar imunizantes, tornando seu desenvolvimento mais rápido.

No Brasil, os resultados alcançados pela CoronaVac e a possibilidade de produção em território nacional confirmam que ainda existe esperança para uma revalorização do setor. Há anos, o país é referência mundial na prevenção de doenças através do Programa Nacional de Imunização (PNI), que se consolidou em 1973, mas, agora, encara regressão, conforme levantamento da OMS. Com a Covid-19, o desafio vai além da falta de recursos e de estrutura: inclui driblar o discurso contrário do presidente da República, que ameaça o alcance e pode levar à judicialização da imunização, e a falta de uma política de saúde consistente para a situação do país.

“De nada adianta cientistas terem desenvolvido vacinas em tempo recorde para que elas fiquem dentro de freezers. Vacinas só funcionam dentro das pessoas e essas pessoas precisam estar muito bem informadas de que elas são seguras e não é uma obrigação tomar vacina, mas sim um direito amparado pelo Estado”, alerta Luiz Almeida, Doutor em Microbiologia na área de Genética de Bactérias pelo ICB-USP e membro do Instituto Questão de Ciência (IQC).

Recorde de casos

Na mesma semana em que o Brasil se viu mais perto da imunização, os números associados à pandemia alcançaram marcos preocupantes: foram ultrapassadas 200 mil mortes – total que, até agora, só havia sido registrado nos Estados Unidos.

Apenas nas últimas 24 horas, ocorreram 483 óbitos, somando 203.140 desde o começo da pandemia. Com isso, a média móvel de mortes no Brasil foi de 1.016 nos últimos 7 dias – a maior nos últimos cinco meses. Em se tratando de diagnósticos, a média móvel dos últimos sete dias bateu recorde desde que os dados começaram a ser medidos: 53.250 novos casos por dia – alta de 54% em duas semanas.

Os números confirmam a previsão de especialistas, que alertaram sobre os riscos das aglomerações em festas de fim de ano. A perspectiva é de novos aumentos se a ciência seguir ignorada por autoridades e população.

“Temos que repetir como mantra: a imunização, a vacina, não pode, de novo, se tornar briga política. Já deveríamos estar pensando na distribuição. Seria necessário um volume grande de informações do governo. Importante destacar que nesses dez meses as pessoas vão cansando. Mas o vírus não cansa”, afirma Breno Monteiro, presidente da Confederação Nacional de Saúde.