A Associação Brasileira de Imprensa (ABI) divulgou, na sexta-feira (26), nota de repúdio ao ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, em função de uma portaria que permite a deportação sumária ou impedimento de ingresso de estrangeiros no Brasil. Na interpretação da entidade, a medida configura uma tentativa de intimidação ao jornalista norte-americano Glenn Greenwald, fundador do Intercept Brasil, que tem divulgado diversas reportagens com mensagens privadas trocadas pelo atual ministro e procuradores da operação Lava-Jato.
A portaria nº 666/2019, publicada no Diário Oficial da União no mesmo dia da manifestação da ABI, estabelece novos parâmetros e regulamentação para a Lei da Migração, sancionada no governo Temer em 2017. Pelo texto, não é necessário sentença judicial para enquadrar um estrangeiro como perigoso em caso de: terrorismo, grupo criminoso com acesso a armas, tráfico de drogas , pessoas ou armas, pornografia ou exploração sexual infanto-juvenil e torcida organizada com histórico de violência em estádios. Basta, por exemplo, a existência de “investigação criminal em curso” ou “informação de inteligência proveniente de autoridade brasileira ou estrangeira”.
Para a Associação Brasileira de Imprensa, a regra é inconstitucional e configura abuso de poder. A entidade enfatiza estar acompanhando o caso, e garante que tomará medidas judiciais caso a portaria seja usada para atingir Greenwald, “em mais um caso de arbítrio e de atentado à liberdade de imprensa”.
Um ato em solidariedade ao jornalista e ao portal está sendo convocado pela Associação para esta terça-feira, na cidade do Rio de Janeiro. A concentração está agendada para as 18h30, na sede da instituição (rua Araújo Porto Alegre, 71 – Centro).
Bolsonaro elogia Portaria e ameaça Greenwald
No sábado (27), Jair Bolsonaro elogiou a Portaria de Moro e referiu-se ao texto com uma ameaça ao jornalista do Intercept. “Talvez pegue uma cana aqui no Brasil”, disse o presidente, durante evento no Rio de Janeiro. Ele também acusou o fundador do Intercept de “malandro”, sugerindo que sua nacionalização teria objetivos jurídicos. Greenwald respondeu as acusações em suas redes sociais e assegurou que continuará defendendo a democracia. “Ao contrário dos desejos de Bolsonaro, ele não é (ainda) um ditador. Ele não tem o poder de ordenar pessoas presas. Ainda existem tribunais em funcionamento. Para prender alguém, tem que apresentar provas para um tribunal que eles cometeram um crime. Essa evidência não existe”, publicou no Twitter. “É verdade que o governo não tem o poder de me deportar. Mas eu tenho o poder de sair o Brasil voluntariamente – e tinha esse poder o tempo todo. Mas não fiz e não vou, apesar dessas ameaças. Porque sei que não têm nada contra mim. Vou defender a democracia do país dos meus filhos”.
Intercept condena declarações de Bolsonaro
A jornalista norte-americana Betsy Reed, chefe de redação do The Intercept, divulgou nota no domingo (28) rebatendo as acusações de Bolsonaro. No material, lembrou que Greenwald é casado há 14 anos, muito antes de coordenar as reportagens sobre mensagens que colocam em dúvida a isenção de membros da força-tarefa. Também disse que a sugestão de que o jornalista pode “pegar uma cana” representa uma ameaça aos repórteres do site.
“O Intercept condena veementemente as declarações que o presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, fez sobre o jornalista e cofundador do Intercept, Glenn Greenwald”, frisa a jornalista. “Somos gratos pela solidariedade dos defensores da liberdade de imprensa de todo o mundo, já que as instituições democráticas brasileiras enfrentam esse profundo teste sob o atual governo, comandado por um autoritário que não vê nada de errado em ameaçar um jornalista por simplesmente exercer sua profissão”.