Após debate no CEPE, UFRGS inicia Ensino Remoto Emergencial em 19 de agosto

Departamentos e Comissões de Graduação (Comgrads) da UFRGS terão cerca de 20 dias corridos para adaptarem planos de ensino, dinâmicas pedagógicas, conteúdos, materiais e atividades avaliativas  ao Ensino Remoto Emergencial (ERE), cujo início foi definido para 19 de agosto. A decisão foi tomada nesta segunda-feira (27), durante o terceiro turno de sessão do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Cepe) para discutir a resolução a ser aplicada.

Até o dia 6, docentes deverão apresentar os planos de ensino, e as Unidades têm até o dia 18 para avaliar a viabilidade das atividades e registrar os planos no sistema. Conforme o calendário geral, o semestre letivo 2020/1 deve ser concluído em 2 de dezembro.  Leia aqui a resolução completa.

Sem acordo ou debate prévio, a resolução do ERE foi votada ponto a ponto

Assim como nesta segunda-feira (27), as duas rodadas de discussão anteriores foram longas e marcadas por momentos de tensão entre a presidência e defensores dos pareceres de vista: um deles, apresentado por três conselheiros discentes; o outro, assinado por dez conselheiros, docentes, discentes e técnico-administrativos em educação, e construído com o apoio de entidades representativas da comunidade acadêmica – inclusive do ANDES/UFRGS.

No início da discussão, na quarta-feira (22),  a presidência do CEPE, contrariando o rito, não colocou em votação os dois pareceres de vista elaborados coletivamente, sob o pretexto de que alguns itens teriam sido incorporados pelo relator, professor João Cesar Netto, presidente da Comissão de Diretrizes do CEPE.

Entretanto, as alterações incorporadas pelo relator se ativeram a detalhes de redação. Por isso, os conselheiros que haviam proposto os pareceres de vista apresentaram vários destaques ao texto original apresentado pela Comissão de Diretrizes do CEPE.
A votação dos destaques foi iniciada na sexta-feira (24) e encerrada no final da tarde da segunda-feira (27), com a aprovação do calendário do ERE.

A avaliação da professora Sandra Loguercio, do Instituto de Letras e conselheira no CEPE, é de que “o regulamento do ERE que acaba de ser aprovado, após somente três sessões de discussão, diminui em parte os danos para os estudantes, que terão garantidos benefícios de assistência, bolsas de monitorias e outras, poderão ajustar sua matrícula, excluindo ou incluindo novas disciplinas, e para os TAEs, que estarão protegidos do trabalho presencial. Trata-se, em primeiro lugar, de conquistas dos pareceres de vista, redigidos de modo colaborativo entre os três segmentos universitários, o que exigiu muitas horas de trabalho por parte dos pareceristas e de colaboradores que se debruçaram seriamente sobre a proposta, de modo que contemplassem os inúmeros processos enviados ao CEPE pelas unidades e outras manifestações da comunidade da UFRGS; em segundo lugar, dos conselheiros que se manifestaram ao longo das sessões, sobretudo das representações discentes e dos TAEs, propondo destaques em um conselho formado majoritariamente de docentes, em boa medida apáticos à discussão. Vários problemas, porém, não foram resolvidos, como a possibilidade de adequação total dos planos de ensino, que pretendem ser uma reprodução do que seria ofertado presencialmente, mas adaptados ao modo remoto, o amparo jurídico a docentes e discentes quando do uso indevido da imagem e o maior de todos os problemas: a dificuldade de acompanhamento de disciplinas obrigatórias, portanto basilares, por parte dos estudantes que não têm condições materiais, estruturais e psíquicas de fazê-lo”.

O parecer de vista apoiado por estudantes, docentes e técnico-administrativos previa apenas disciplinas eletivas e créditos complementares no ERE, com exceção para formandos, que poderiam cursar disciplinas obrigatórias. “Dois pontos essenciais defendidos no parecer de vista dos conselheiros que não foram incorporados à proposta final são o caráter das atividades que serão oferecidas e a composição da comissão que terá a função de acompanhar a implementação do ERE. O primeiro ponto, que defendia o oferecimento somente de atividades de extensão, de pesquisa e de disciplinas eletivas (sendo as obrigatórias reservadas somente a ingressantes e formandos), tinha por objetivo garantir que estudantes que não possam cursar o semestre de forma remota não sejam prejudicados em sua formação por não cursarem disciplinas obrigatórias nesse período” afirma Daniele Cunha, professora do Colégio de Aplicação e Conselheira do CEPE, sobre o parecer de vista.

A garantia do uso de software livre para a aplicação do ensino remoto, também defendida por estudantes, docentes e técnico-administrativos, não foi aprovada. “A Reitoria já fez até uma assinatura do Google Classroom, antes mesmo da aprovação do CEPE”, lamenta Sibila Binotto, coordenadora da Assufrgs.

“Apesar de não termos conseguido aprovar grande parte das questões que defendemos no Cepe, os representantes dos estudantes, dos técnicos e dos docentes que defenderam o parecer de vista desempenharam um papel muito importante acrescentando novos elementos à discussão e não permitindo que a proposta do ERE fosse aprovada totalmente às pressas e sem levar em conta diversas demandas da comunidade da UFRGS. Assim, o debate sobre o ensino remoto, que deveria ter envolvido amplamente todos os segmentos da UFRGS e poderia ter sido feito dessa forma desde o início (estamos há quatro meses sem atividades presenciais!), tornou-se um pouco mais coletivo. É fundamental garantir que pautas dessa importância sejam debatidas da forma mais ampla possível pela comunidade universitária antes de chegarem a instâncias decisórias como CEPE e Consun”, destaca a professora Daniele Cunha.

“A Reitoria queria que somente o parecer da Comissão fosse votado, sendo que os dois pareceres de vista faziam várias alterações. Na reunião do dia 24 tentamos passar vários destaque por consenso; tinham alguns artigos que falavam da paridade para a comissão que iria cuidar do ERE. No entanto, a Reitoria se mostrou não querendo ser paritária e não querendo ser democrática. Para eles o conceito de democracia é outro. Conseguimos aprovar vários artigos que são interessantes tanto para os alunos de graduação, quanto de pós-graduação, como o estágio docência”, aponta a Conselheira Adriana Winter, representante dos discentes de pós-graduação.

Protocolos para eventuais atividades presenciais

A resolução aprovada prevê que as disciplinas sejam ofertadas de forma completamente remota, sempre que possível. Para os casos excepcionais de carga horária presencial, deverão ser observados protocolos de proteção à saúde. Foi proposto que participassem dessa construção as Comissões de Saúde e Ambiente de Trabalho (COSATs), órgãos deliberativos sobre questões pertinentes à saúde, à segurança e ao ambiente de trabalho, em cada Unidade, e também o CONSSAT (Conselho das COSATs). A proposta foi rejeitada pelo relator e pela maioria do plenário, delegando toda a regulamentação sobre atividades presenciais ao Comitê de Enfrentamento à Covid 19-UFRGS, que não conhece as condições de trabalho nas unidades, não foi escolhida pela comunidade e não vem dando publicidade às suas reuniões e deliberações.

Além disso, não foi aprovada emenda garantindo que a Universidade se responsabilizará pelo oferecimento de EPIs à comunidade – conduta que  também era proposta no parecer de vista, desenvolvida com base em contribuições de Departamentos, Comissões de Graduação (Comgrads) e Conselhos de Unidade.

Matrículas e conceitos

Uma proposta comum aos dois pareceres de vista era possibilitar o ajuste de matrícula, já que haverá mudanças nas disciplinas oferecidas e na modalidade de oferta, e também considerando que as condições atuais dos estudantes para dedicação ao estudo são diferentes daquelas de março. Rejeitando essa alteração, o relator Netto alegou que será mantido, como sempre, o expediente da correção de matrícula, ao longo de todo o semestre letivo. Mas, para essa correção, o estudante precisará da anuência e do empenho da Comissão de Graduação.

Visando reduzir prejuízo aos estudantes, foi aprovado, ainda, que excepcionalmente durante o período de Ensino Remoto Emergencial não será aplicada a atribuição de conceito FF (Falta de Frequência), sendo incluída a atribuição NI (Não informado) no campo de conceito do sistema acadêmico, junto com a justificativa do período de excepcionalidade. Os casos de não informação de conceito deverão ser resolvidos até o fim do segundo período letivo após o fim da pandemia. A proposta de não atribuição de conceito D, apresentada em um parecer de vista, não foi incorporada à Resolução.

As atividades de monitoria deverão seguir os planos específicos dos setores responsáveis, de acordo com as recomendações da Prograd.

Atropelamento

Para o professor Guilherme Dornelas, diretor da Seção Sindical do ANDES-SN na UFRGS, docentes enfrentarão problemas para aplicar o sistema de forma tão rápida. “Não sabemos como será a condição dos alunos, se todos conseguirão acessar e fazer suas atividades. É um tempo pequeno de preparação. O debate nesta segunda-feira foi tão atropelado que a Reitoria quase aprova o calendário sem discussão”, pontua. O calendário foi aprovado após o propositor do parecer original, conselheiro João César Netto, aceitar postergar em dois dias o início e demais datas do calendário ERE.

Risco de aumento da desigualdade

Sobre a oferta de disciplinas obrigatórias, a conselheira Sandra Loguercio aponta que “na prática, isso resulta em exclusão dos mais vulneráveis e fragilizados pela pandemia e pela crise econômica que assola o país, aprofundando as desigualdades já existentes na universidade e em nossa sociedade. Nesse sentido, será de extrema importância que cada unidade se comprometa a realizar um levantamento rigoroso, ao longo do semestre e após sua conclusão, daqueles que ficaram para trás, de modo que a universidade e a sociedade tenham a exata dimensão dos danos causados por um ensino remoto em meio às crises sanitária, política e econômica em que vivemos”.

O objetivo do parecer divergente era justamente diminuir os riscos de disparidade entre estudantes de condições socioeconômicas distintas e favorecer a inclusão. “É imprescindível considerar todos os efeitos da desigualdade social combinados à crise sanitária e econômica. Diversos alunos moram em casas com número reduzido de cômodos, não havendo espaço adequado para concentração e desenvolvimento das atividades”, aponta nota divulgada pelo DCE, que também pedia atenção especial à saúde mental dos alunos, possivelmente  afetada devido à crise que todos estão vivenciando.

Uma pesquisa da própria Prograd, realizada entre maio e junho de 2020 com 14.964 estudantes da UFRGS (sendo 46,1% dos alunos da graduação), constatou que 357 dos respondentes (2,4%) não tinham acesso à internet. Além disso, 12,3% assinalaram que não utilizam Wi-fi em sua residência.

É possível, no entanto, que o número de alunos com a conexão precária ou sem qualquer acesso à internet seja muito maior, pois mais da metade dos alunos nem mesmo respondeu à enquete. “É notório que há um contingente considerável de estudantes sem condições materiais objetivas e subjetivas de continuidade de formação de graduação de forma remota, visto que 53,9% das/os estudantes não responderam o questionário enviado pela Prograd para sondar as condições de acesso e adesão ao ERE”, avaliou o Conselho da Faculdade de Educação (Confaced) em nota, acrescentando que “pensar uma Universidade inclusiva e inovadora representa pensar alternativas que priorizem a vida a partir da coerência entre o que se propõe e as decisões que se toma”. O Instituto de Psicologia e o Instituto de Letras também manifestaram publicamente preocupação com o formato sugerido pela Pró-Reitoria.

Ainda segundo o levantamento da Administração Central, 811 dos alunos beneficiários de assistência estudantil que participaram da pesquisa (37,90%) têm de compartilhar seus equipamentos com outras pessoas no local onde vivem, e 34,58% desses bolsistas tiveram de assumir novas responsabilidades com a chegada da pandemia. Do total de alunos que responderam, 14,3% são beneficiários do programa de assistência estudantil, que fornece auxílio para pessoas de baixa renda.

Comissão de Acompanhamento do ERE

A Comissão-ERE será composta por 22 membros – sendo somente dois estudantes.

“Os conselheiros que votaram a favor dessa comissão deveriam ter vergonha. O ERE vai afetar principalmente a vida de todos os estudantes. Colocar apenas dois representantes estudantes, de um total de 22 membros, é lamentável. Também serão indicados pelo Cepe apenas dois técnicos e dois docentes, os demais todos serão escolhidos pela administração central”, condena Rafael Berbigier, coordenador da Assufrgs.

Algumas definições para o ERE na UFRGS

Veja abaixo algumas definições para o ERE na UFRGS, segundo levantamento da Assufrgs:

✅   Oferta de todos os tipos de disciplinas, inclusive as obrigatórias;

✅  Possível necessidade de trabalho presencial para a preparação das aulas será determinada pelo Comitê Covid-19, que não conta com a presença do CONSSAT e das COSATs;

✅  Inclusão de atividades no processo de correção de matrículas;

✅  Pós-graduandos não poderão dar aulas no ERE sem o acompanhamento devido dos professores;

✅  Garantida a gravação ou o salvamento das atividades síncronas para o acesso posterior dos alunos que não tenham condições do comparecimento simultâneo;

✅  Avaliação síncrona sem acordo com a totalidade dos alunos;

✅  Não aplicabilidade do conceito FF – utilização do conceito D e NI;

✅  Garantia das bolsas de monitoria após início das atividades;

✅  Atividades sem créditos para manutenção do vínculo com a universidade

✅  Período de correção de matrícula;

✅  Comissão não-paritária para acompanhamento do ERE.