39º Núcleo do CPERS denuncia intervenção nas escolas cívico-militares

O 39º Núcleo do CPERS, que tem se mobilizado contra a implantação do Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares (Pecim) no Rio Grande do Sul, alerta para o risco de intervenção nas instituições de ensino e para a inconstitucionalidade do modelo, que fere a LDB (Lei de Diretrizes e Bases), o Plano Nacional da Educação e a Lei da Gestão Democrática.

Na segunda-feira (4), foi realizada audiência pública sobre o tema, proposta pelas deputadas Luciana Genro (PSol) e Sofia Cavedon (PT) a pedido da entidade, na Assembleia Legislativa. “Entendemos que a audiência pública serviu para tornar público o debate que já vinha sendo travado, pois a intenção vai muito além do que argumentam defensores do projeto”, explica Neiva Lazzaroto, diretora licenciada do 39º Núcleo.

Para a docente, um documento intitulado “Diretrizes das Escolas Cívico-Militares” explicita a intenção de intervir no processo político-pedagógico das instituições de ensino através da presença de um Oficial de Gestão Escolar, assessor em assuntos referentes à área educacional, didático-pedagógica e administrativa, podendo, inclusive, participar da formação continuada dos profissionais para implantação do modelo. “Não é uma simples presença de militares aposentados para serem monitores responsáveis pela ordem e disciplina, o que já é muito grave. O verdadeiro objetivo está na doutrinação e no aliciamento de jovens para a ideologia neofascista, que é o que defende o governo Bolsonaro”, acrescenta.

Neiva reforça que “numa escola pública devemos ter profissionais contratados com formação para a área da Educação, e que os militares devem cumprir seu papel constitucional”. E aponta outra preocupação do manual de diretrizes: afirmações que associam finalidade, valores e fundamentos aos colégios militares, “como se escola pública não pregasse e construísse valores de respeito, civismo, honestidade e não buscasse a excelência da educação, apesar de todas as adversidades e dos sucessivos cortes de verbas nas escolas públicas e universidades, que formam os educadores”.

Denúncias

Além da solicitação da audiência pública, o 39º Núcleo do sindicato também ingressou com uma Ação Civil Pública contra o programa. “É nosso dever histórico de lutadores e defensores da escola pública, gratuita, de qualidade, laica e a serviço de um projeto de desenvolvimento social para todos, sem discriminação nem privilegiamento”, esclarece a professora Leonor Eugenia Ferreira, representante da Diretoria do 39° Núcleo do CPERS.

Conforme Leonor, também falta transparência a respeito do total de escolas em que o programa já está implantado. “Tivemos acesso a um documento de 7 de janeiro assinado pelo diretor geral da Secretaria de Educação (Seduc), Guilherme Corte, sinalizando ao MEC a adesão de 11 escolas para 2022.

Uma delas era a escola Visconde do Rio Grande, de Porto Alegre, foco de denúncia da professora Cíntia Bordini, na entidade, a respeito da “implantação desrespeitosa, antidemocrática e atropelada de uma apresentação feita não por um responsável da Secretaria da Educação, mas por um assessor do tenente Coronel Zucco – autor da lei que prevê a criação de escolas cívico-militares no estado, cujo projeto foi publicado dez dias depois do decreto federal, em uma ação totalmente orquestrada”, relata.

Além disso, menciona denúncias em instituições onde o sistema já está em andamento, inclusive no estado, onde vídeos postado em redes sociais mostram o treinamento de marcha aplicado em estudantes da escola Carlos Drummond de Andrade, em Alvorada, por militares portando armas.

Audiência Pública

Durante a Audiência Pública, que ocorreu no âmbito da Comissão de Educação, Cultura, Desporto, Ciência e Tecnologia da casa parlamentar, Cíntia denunciou ter sido perseguida e transferida da escola por questionar a implantação da ECM, mesmo trabalhando com a Educação de Jovens e Adultos (EJA), que não faz parte do programa. Citou, ainda, acusações de estudantes relativas a ameaças, submissão, constrangimento e assédio em ECMs no Paraná e Amazonas. “Esse projeto não tem base em estudos pedagógicos nem estatísticos, só possui fator ideológico e arcaico”, criticou a professora.

“A extrema direita levou representantes da escola Visconde de Rio Grande (e outros partidários, em um ônibus) que optou pelo modelo e que afirmaram ter feito a escolha democraticamente, mas foram desmentidos pelo vice-diretor, que se exonerou do cargo por discordar do processo pouco democrático e sem debate da escolha”, revela o professor Felipe Adami, diretor do ANDES/UFRGS, que esteve presente.

“Este governo criou o Pecim como uma afronta à classe dos professores. Professores que sofreram perseguição quando ousaram discordar da imposição de modelos de ensino equivocados e da distorção de fatos históricos. Que se opuseram às práticas de tortura e da imposição de ideias da ditadura militar a qual, em nossa universidade foi responsável pelos expurgos de docentes, funcionários e estudantes, sem contar casos ainda piores, de tortura e de execução, os quais sabemos que ocorreram por todo o Brasil. Não podemos aceitar uma instituição que foi responsável por tais atrocidades interferindo nos rumos da educação”, finaliza.

 

Foto: Site CPERS